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escola — do bocó suarento eletrizado com a ideia de “ficar de mãos<br />

dadas” ao estuprador cheio de si com pústulas no rosto e um carro<br />

envenenado — só podiam parecer igualmente tediosas à minha<br />

sofisticada jovem amante. “Todo esse estardalhaço em torno dos rapazes<br />

me deixa enojada”, escrevera ela na capa interna de um caderno escolar,<br />

e logo abaixo, na letra de Mona (Mona irá aparecer brevemente), vinha a<br />

pergunta capciosa: “E o que me diz de Rigger?” (brevemente também<br />

aqui).<br />

Sem rosto, assim, eram os rapazolas que eu via ocasionalmente em<br />

sua companhia. Havia por exemplo o Suéter Vermelho que numa<br />

ocasião, no dia em que caíram as primeiras neves — veio trazê-la em<br />

casa; da janela da sala fiquei observando enquanto conversavam perto<br />

da nossa entrada. Ela usava seu primeiro casaco com gola de peles; e<br />

mais um gorrinho castanho coroando meu penteado predileto — a franja<br />

na frente, as ondas dos lados e os cachos naturais na nuca —, além dos<br />

mocassins escuros para usar em tempo molhado, com as meias brancas<br />

mais maltratadas do que nunca. Como sempre ela segurava os livros<br />

apertados contra o peito enquanto falava ou ouvia, e seus pés<br />

gesticulavam o tempo todo: apoiava-se no arco do pé esquerdo e na<br />

ponta do dedo maior do direito, depois puxava este pé para trás, cruzava<br />

os dois, oscilava ligeiramente, esboçava alguns passos, e em seguida<br />

recomeçava toda a série. E também o Jaqueta Fechada, que ficara<br />

conversando com ela na porta do restaurante numa tarde de domingo<br />

enquanto a mãe e a irmã dele tentavam me afastar dos dois a pretexto<br />

de uma conversa; deixei-me levar arrastando os pés, mas virando a<br />

cabeça para meu único amor. Ela exibiu mais de um maneirismo<br />

convencional, como o atencioso gesto adolescente de demonstrar que<br />

realmente “dobrou” de tanto rir inclinando a cabeça, e assim (ao<br />

perceber meu chamado), ainda simulando uma hilaridade<br />

descontrolada, deu alguns passos para trás e em seguida fez meia-volta,<br />

partindo na minha direção com um sorriso que se apagava. Por outro<br />

lado, eu gostava muito — talvez porque me lembrasse de sua primeira<br />

confissão inesquecível — do seu modo de dizer “ai meu Deus” numa<br />

submissão humorística e caprichosa ao destino, ou de emitir um<br />

prolongado “nã-ão” num tom profundo e quase grunhido toda vez que<br />

era de fato golpeada pelo destino. Acima de tudo — uma vez que<br />

estamos falando de movimento e juventude —, eu gostava de vê-la<br />

circulando para cima e para baixo na Thayer Street em sua linda<br />

bicicleta novinha: pondo-se de pé para pedalar com mais vigor, depois<br />

mergulhando de volta numa postura lânguida enquanto a velocidade se<br />

esgotava; em seguida, parava junto à nossa caixa de correio e, sem<br />

desmontar, folheava alguma revista que encontrasse ali, que depois<br />

punha de volta, apertando a língua contra um lado do lábio superior

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