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sim uma garota simples e rústica, com os pés bem plantados na terra<br />

escura — e um beijo no último minuto pretendia reforçar a mensagem<br />

mais profunda da peça, a saber, que ilusão e realidade fundem-se no<br />

amor. Achei prudente não criticar a coisa toda na frente de Lo: ela<br />

atacava com tal vigor seus “problemas de expressão”, e com tamanho<br />

encanto juntou as mãos florentinas, bateu os cílios e me suplicou para<br />

não comparecer aos ensaios como certos pais ridículos, porque estava<br />

determinada a surpreender-me com uma Estreia perfeita — e porque eu,<br />

de qualquer maneira, acabaria me metendo, dizendo a coisa errada e<br />

prejudicando o desempenho dela na frente dos outros.<br />

Houve um ensaio muito especial... meu coração, meu coração...<br />

houve um dia de maio marcado por um alvoroço intenso e animado — e<br />

tudo aquilo se desenrolava fora do alcance do meu conhecimento, imune<br />

à minha memória, e quando vi Lo depois disso, ao fim da tarde,<br />

equilibrada em sua bicicleta, apoiando a palma da mão na casca úmida<br />

de um jovem vidoeiro à beira do nosso gramado, fiquei tão<br />

impressionado com a ternura radiosa de seu sorriso que por um instante<br />

julguei que fosse o fim de todos os nossos problemas. “Você se lembra”,<br />

disse ela, “do nome daquele hotel, você sabe qual [nariz franzido], você<br />

sabe — com as colunas brancas e o cisne de mármore na entrada? Ah,<br />

você sabe [exalação muito ruidosa] — o hotel onde você me violou. Está<br />

bem, esqueça. Quer dizer, era [quase num sussurro] Os Caçadores<br />

Encantados? Oh, quer dizer que era? [introspectiva] Era mesmo?” — e<br />

com um ladrido de riso amoroso e primaveril ela deu um tapa ruidoso no<br />

tronco muito claro e disparou ladeira acima, até o fim da rua, e depois<br />

desceu de volta, os pés pousados nos pedais imóveis, a postura relaxada,<br />

uma das mãos sonhadora em seu colo de estampa florida.<br />

14<br />

Como supostamente a música tinha a ver com seu interesse pela dança<br />

e o teatro, eu permitira a Lo fazer aulas de piano com uma certa srta.<br />

Emperor (como nós, conhecedores da literatura francesa, poderíamos<br />

convenientemente apelidá-la), até cuja casinha branca com janelas<br />

azuis, um quilômetro e meio para fora de Beardsley, Lo pedalava duas<br />

vezes por semana. Numa noite de sexta-feira perto do final de maio (e<br />

mais ou menos uma semana depois do ensaio muito especial a que Lo<br />

não me deixara assistir), quando me encontrava no meu escritório em<br />

pleno processo de dizimar as peças do lado do rei de Gustave — digo, de<br />

Gaston —, o telefone tocou e a srta. Emperor perguntou-me se Lo iria à<br />

aula na terça-feira seguinte, pois tinha faltado às aulas da terça anterior<br />

e de hoje. Eu disse que ela iria, sem a menor dúvida — e continuei com o<br />

jogo. Como o leitor bem pode imaginar, a partir de então minhas<br />

faculdades ficaram prejudicadas, e um ou dois lances mais tarde,<br />

quando era a vez de Gaston jogar, percebi através da névoa do meu

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