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deixando em seu lugar apenas aquela lucidez terrível. Ah, ela mudara<br />

muito! Seu rosto era agora o de qualquer ginasiana desarrumada e<br />

vulgar, que compartilha cosméticos para aplicá-los com os dedos<br />

melados no rosto que sequer lavou e nem se importa com qual superfície<br />

impura, com qual epiderme pustulosa, sua pele entra em contato desse<br />

modo. Suas pétalas macias e lisas tinham sido tão adoráveis nos dias de<br />

outrora, tão reluzentes de lágrimas, quando eu costumava, de<br />

brincadeira, fazer sua cabeça despenteada rolar em meus joelhos. Um<br />

rubor grosseiro substituíra agora aquela inocente fluorescência. O que<br />

era localmente conhecido como “resfriado de coelho” tingira de um<br />

rubor flamejante as orlas de suas narinas desdenhosas. Enquanto<br />

tomado de terror eu baixava meu olhar, este escorregou mecanicamente<br />

ao longo da face inferior de sua coxa nua tensamente estendida — suas<br />

pernas tinham ficado tão lisas e musculosas! Ela mantinha os olhos<br />

separados, de um cinza de cristal opaco e enevoado, fixos em mim, e<br />

neles vi revelado o pensamento sorrateiro de que talvez afinal Mona<br />

tivesse razão, e ela, a órfã Lo, pudesse me acusar sem sofrer ela própria<br />

qualquer castigo. Como eu me enganava. Como eu estava furioso! Tudo<br />

nela era exasperante e impenetrável — a força de suas pernas torneadas,<br />

a sola suja de suas meias brancas, o suéter grosso que vestia embora a<br />

sala estivesse fechada, seu cheiro de rapariga, e especialmente a<br />

extremidade morta do seu rosto, com seu estranho rubor e seus lábios<br />

recém-retocados. Parte do vermelho deixara vestígios em seus dentes da<br />

frente, e fui tomado de surpresa por uma lembrança pavorosa — a<br />

imagem evocada não de Monique, mas de outra jovem prostituta num<br />

bordel medonho, séculos atrás, que fora escolhida por alguma outra<br />

pessoa antes que eu tivesse o tempo de resolver se a sua mera<br />

juventude compensaria eu correr o risco de alguma doença pavorosa, e<br />

que tinha exatamente as mesmas pommettes salientes e coradas,<br />

também perdera sua maman, tinha dentes da frente grandes e usava um<br />

laço de fita vermelha encardida nos cabelos castanhos de camponesa.<br />

“Pode falar”, disse Lo. “A corroboração foi satisfatória?”<br />

“Ah, sim”, respondi. “Perfeita. Claro. E não tenho a menor dúvida que<br />

toda inventada por vocês duas. Na verdade, não duvido que você tenha<br />

contado a ela tudo sobre nós dois.”<br />

“Ah, é?”<br />

Controlei a respiração e disse: “Dolores, isto precisa acabar aqui.<br />

Estou quase arrancando você da Beardsley para trancá-la você sabe<br />

onde, mas isso precisa parar. Estou disposto a levar você embora assim<br />

que tiver tempo de acabar de fazer a mala. Se isso não parar, tudo pode<br />

acontecer.”<br />

“Tudo pode acontecer, é mesmo?”<br />

Puxei num arranco o banco que ela balançava com o calcanhar e seu

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