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o traslado até a Lawn Street a bordo daquele carro fúnebre, sentindo que<br />

de outro modo McCoo acabaria arquitetando um meio ainda mais<br />

elaborado de livrar-se de mim. Vi-o afastar-se rapidamente, e meu chofer<br />

apertou-lhe a mão com um riso abafado. A caminho, jurei a mim mesmo<br />

que nem em sonhos ficaria em Ramsdale, quaisquer que fossem as<br />

circunstâncias, e que ainda aquele dia iria voar para as Bermudas, as<br />

Bahamas ou a Boca do Inferno. Possíveis deleites em praias<br />

tecnicoloridas já vinham fazendo cócegas na minha espinha havia algum<br />

tempo, e o primo de McCoo, na verdade, tinha desviado bruscamente<br />

esse encadeamento de ideias com sua sugestão bem-intencionada mas,<br />

como agora ficava claro, totalmente idiota.<br />

E por falar em guinadas súbitas: quase atropelamos um agressivo<br />

cão dos subúrbios (desses que ficam à espreita dos carros) quando<br />

dobramos a esquina para entrar na Lawn Street. Um pouco mais adiante,<br />

a residência Haze, um horror sobre vigas brancas, apareceu, com um ar<br />

velho e encardido, mais acinzentada do que branca — o tipo de lugar<br />

que teria evidentemente um tubo de borracha ajustado à bica da<br />

banheira para servir de chuveiro. Dei uma gorjeta ao chofer e esperei<br />

que ele fosse embora de imediato, para que eu pudesse dar meia-volta<br />

na mesma hora e regressar despercebido para o meu hotel e minha<br />

mala; mas o homem se limitou a atravessar para o outro lado da rua,<br />

onde uma velha senhora o chamava da entrada de sua casa. O que mais<br />

eu poderia fazer? Apertei a campainha.<br />

Uma empregada de cor me disse para entrar — e me deixou de pé no<br />

capacho enquanto corria de volta para a cozinha, onde queimava<br />

alguma coisa que não devia queimar.<br />

A entrada da casa estava adornada com um carrilhão de tubos,<br />

alguma coisa de madeira com olhos brancos e origem comercial<br />

mexicana, e uma cópia da favorita mais frequente da classe média com<br />

alguma pretensão artística, a Arlésienne, de Van Gogh. Uma porta<br />

escancarada à direita proporcionava a visão de uma sala de estar, com<br />

mais amostras de lixo mexicano numa estante de canto e um sofá<br />

listrado encostado à parede. Havia uma escada ao final do hall de<br />

entrada, e enquanto eu enxugava a testa (só agora percebi o calor que<br />

fazia fora) e fitava, só para ter o que fitar, uma velha bola de tênis<br />

acinzentada largada em cima de um baú de carvalho, soou no andar de<br />

cima a voz de contralto da sra. Haze, que, debruçando-se na balaustrada,<br />

perguntou melodiosamente, “É Monsieur Humbert?”. Um pouco de cinza<br />

de cigarro também despencou do alto seguindo o som de suas palavras.<br />

E em seguida, a dama em pessoa — sandálias, calça marrom, blusa de<br />

seda amarela, rosto quadrado, nessa ordem — desceu os degraus da<br />

escada, ainda desferindo pancadinhas no cigarro com o dedo indicador.<br />

Acho melhor descrevê-la de uma vez, livrando-me logo da tarefa. A

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