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Tive um encontro com ela no dia seguinte às duas e quinze da tarde<br />
em meus próprios aposentos, só que menos bem-sucedido, ela parecia<br />
ter-se tornado menos juvenil, mais mulher de um dia para o outro. Um<br />
resfriado que peguei dela me levou a cancelar um quarto encontro, mas<br />
não deplorei ter interrompido uma série emocional que ameaçava<br />
sobrecarregar-me de fantasias dilacerantes e depois desfazer-se em<br />
tediosa decepção. Deixemos então que permaneça a esbelta e esguia<br />
Monique que foi por um ou dois minutos: uma ninfeta delinquente cujo<br />
brilho se deixava perceber através da jovem prostituta trivial.<br />
Meu breve contato com ela iniciou um encadeamento de ideias que<br />
pode parecer bastante óbvio ao leitor que entende do riscado. Um<br />
anúncio numa revista pornográfica levou-me, num dia de bravura, à sala<br />
de uma certa Mlle. Edith, que começou me propondo a escolha de uma<br />
alma irmã a partir de uma coleção de fotografias bastante formais<br />
reunidas num álbum muito manchado (“Regardez-moi cette belle<br />
brune!”). Quando empurrei o álbum para a frente e consegui revelar-lhe<br />
de algum modo meus desejos criminosos, ela pareceu ter ficado a ponto<br />
de pôr-me para fora; entretanto, depois de perguntar-me que preço eu<br />
me dispunha a desembolsar, admitiu pôr-me em contato com uma<br />
pessoa qui pourrait arranger la chose. No dia seguinte, uma mulher<br />
asmática, o rosto coberto por maquilagem grosseira, cheirando a alho e<br />
muito loquaz com um sotaque provençal quase farsesco e um bigode<br />
negro sobre um lábio arroxeado, levou-me até o que parecia ser seu<br />
próprio domicílio e lá, depois de um beijo explosivo nas pontas reunidas<br />
de seus dedos gordos para assinalar a deleitável qualidade de botão de<br />
sua mercadoria, afastou teatralmente uma cortina para revelar o que<br />
julguei ser a parte do aposento onde uma família extensa e pouco<br />
exigente costumava dormir. Naquele momento estava vazia, salvo por<br />
uma rapariga de pelo menos uns quinze anos monstruosamente gorda,<br />
descorada e de uma feiura repulsiva, com grossas tranças negras<br />
amarradas por fitas vermelhas, sentada numa poltrona fingindo<br />
acalentar uma boneca sem cabelos. Quando sacudi a cabeça e tentei<br />
desvencilhar-me da armadilha, a mulher, falando muito depressa,<br />
começou a remover o surrado suéter de lã que cobria o torso da jovem<br />
giganta; e então, vendo a minha determinação em partir, exigiu son<br />
argent. Uma porta na extremidade do cômodo se abriu, e dois homens<br />
que jantavam na cozinha se juntaram ao tumulto. Tinham o corpo<br />
malformado e eram muito morenos, traziam os colarinhos abertos e um<br />
deles usava óculos escuros. Atrás deles apareceram um menino pequeno<br />
e um bebê que mal andava, com as pernas tortas e o nariz escorrendo.<br />
Com a lógica insolente de um pesadelo, a proxeneta enraivecida,<br />
indicando o homem de óculos, declarou que ele tinha trabalhado na<br />
polícia, lui, de maneira que convinha eu obedecer. Andei até junto de