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Carl Sagan, em "O mundo assombrado pelos demônios - Interessante

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hábito de acreditar nos acontecimentos mais extraordinários. Sentiam, ou<br />

fantasiavam, que de todos os lados eram incessant<strong>em</strong>ente atacados por<br />

d<strong>em</strong>ônios, consolados por visões, instruídos pela profecia e<br />

surpreendent<strong>em</strong>ente salvos do perigo, da doença e até da morte pelas<br />

súplicas da Igreja [...].<br />

Eles tinham a firme convicção de que o ar que respiravam estava povoado<br />

de inimigos invisíveis; de inumeráveis d<strong>em</strong>ônios, que observavam todos<br />

os acontecimentos e assumiam todas as formas para aterrorizar e, acima<br />

de tudo, para tentar a sua virtude desprotegida. A imaginação e até os<br />

sentidos eram enganados pelas ilusões do fanatismo imoderado; e o<br />

er<strong>em</strong>ita, que via sua oração de meia-noite ser dominada pelo cochilo<br />

involuntário, podia facilmente confundir os fantasmas de horror ou prazer<br />

que tinham preenchido o seu sono e os seus sonhos acordados [...].<br />

[A] prática da superstição é tão congenial à multidão que, se as pessoas<br />

são forçadas a despertar, elas ainda lamentam a perda de sua visão<br />

prazerosa. O seu amor ao maravilhoso e ao sobrenatural, a sua<br />

curiosidade <strong>em</strong> relação a acontecimentos futuros e a sua forte propensão a<br />

colocar as suas esperanças e medos além dos limites do <strong>mundo</strong> visível<br />

foram as principais causas que favoreceram o estabelecimento do<br />

politeísmo. É tão pr<strong>em</strong>ente no povo a necessidade de acreditar <strong>em</strong> alguma<br />

coisa que a queda de qualquer sist<strong>em</strong>a mitológico será muito<br />

provavelmente seguida pela introdução de algum outro modo de<br />

superstição [...].<br />

Vamos deixar de lado o esnobismo social de Gibbon: o diabo<br />

também atormentava as classes altas, e até um rei da Inglaterra – Jaime I, o<br />

primeiro monarca Stuart – escreveu um livro crédulo e supersticioso sobre os<br />

d<strong>em</strong>ônios (Da<strong>em</strong>onologie, 1597). Ele foi também o patrocinador da excelente<br />

tradução da Bíblia para o inglês que ainda leva o seu nome. O rei Jaime<br />

achava que o tabaco era a “erva daninha do diabo”, e várias bruxas foram<br />

descobertas por ter<strong>em</strong> o vício dessa droga. Mas, <strong>em</strong> 1628, ele se tornara um<br />

cético r<strong>em</strong>atado – principalmente porque adolescentes foram descobertos<br />

fingindo possessão d<strong>em</strong>oníaca, <strong>em</strong> cujo estado tinham acusado pessoas<br />

inocentes de bruxaria. Se consideramos que o ceticismo que Gibbon afirma<br />

ter caracterizado a sua época diminuiu na nossa, e se até um pouco da<br />

credulidade desenfreada que ele atribui ao final da época clássica ainda<br />

sobrevive na nossa, não é de se esperar que alguma coisa s<strong>em</strong>elhante a<br />

d<strong>em</strong>ônios encontre um nicho na cultura popular do presente?<br />

Como os entusiastas de visitas extraterrestres são rápidos <strong>em</strong> me<br />

l<strong>em</strong>brar, há certamente outra interpretação desses paralelos históricos: os<br />

alienígenas, diz<strong>em</strong> eles, s<strong>em</strong>pre nos visitaram, intrometendo-se na nossa vida,<br />

roubando nossos espermas e ovos, fecundando-nos. Nos t<strong>em</strong>pos antigos, nós<br />

os reconhecíamos como deuses, d<strong>em</strong>ônios, duendes ou espíritos; só agora

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