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Carl Sagan, em "O mundo assombrado pelos demônios - Interessante

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esforços para arrancar a medicina do terreno da superstição e trazê-la à luz<br />

da ciência. Numa passag<strong>em</strong> típica, Hipócrates escreveu: “Os homens acham a<br />

epilepsia divina, simplesmente porque não a compreend<strong>em</strong>. Mas se<br />

chamass<strong>em</strong> de divino tudo o que não compreend<strong>em</strong>, ora, as coisas divinas<br />

não teriam fim”. Em vez de reconhecer que <strong>em</strong> muitas áreas somos<br />

ignorantes, t<strong>em</strong>os nos inclinado a dizer, por ex<strong>em</strong>plo, que o Universo está<br />

impregnado com o inefável. A um Deus das Lacunas é atribuída a<br />

responsabilidade pelo que ainda não compreend<strong>em</strong>os. Como o conhecimento<br />

da medicina t<strong>em</strong> se desenvolvido desde o século IV a.C., cada vez mais<br />

aumenta o que compreend<strong>em</strong>os e diminui o que tinha de ser atribuído à<br />

intervenção divina – a respeito das causas ou do tratamento da doença. As<br />

mortes na hora do parto e a mortalidade infantil decresceram, o t<strong>em</strong>po de<br />

vida foi prolongado, e a medicina melhorou a qualidade de vida para bilhões<br />

de seres humanos <strong>em</strong> todo o planeta.<br />

Hipócrates introduziu el<strong>em</strong>entos do método científico no<br />

diagnóstico da doença. Ele recomendava com insistência a observação<br />

cuidadosa e meticulosa: “Não deix<strong>em</strong> nada ao acaso. Não percam nenhum<br />

detalhe. Combin<strong>em</strong> as observações contraditórias. Não tenham pressa”.<br />

Antes da invenção do termômetro, ele fez o gráfico das curvas de<br />

t<strong>em</strong>peratura de muitas doenças. Recomendava que os médicos foss<strong>em</strong><br />

capazes de explicar, somente a partir dos sintomas presentes, o provável<br />

desenvolvimento passado e futuro de cada doença. Enfatizava a honestidade.<br />

Estava disposto a admitir as limitações do conhecimento médico. Não se<br />

envergonhava de contar para a posteridade que mais da metade de seus<br />

pacientes morrera das doenças que ele estava tratando. Suas opções de ação<br />

eram limitadas; os r<strong>em</strong>édios de que dispunha eram principalmente laxantes,<br />

<strong>em</strong>éticos e narcóticos. Realizavam-se cirurgias e cauterização. Outros<br />

progressos consideráveis ainda foram feitos <strong>em</strong> toda a época clássica, até a<br />

queda de Roma.<br />

Enquanto a medicina floresceu no <strong>mundo</strong> islâmico, o que seguiu na<br />

Europa foi na realidade uma era negra. Grande parte do conhecimento de<br />

anatomia e cirurgia se perdeu. Era muito difundido o recurso às orações e às<br />

curas milagrosas. Os médicos seculares foram extintos. Empregavam-se por<br />

toda parte cantilenas, poções, horóscopos e amuletos. As dissecações de<br />

cadáveres foram restringidas ou proscritas, por isso aqueles que praticavam a<br />

medicina não podiam adquirir <strong>em</strong> primeira mão o conhecimento do corpo<br />

humano. A pesquisa médica ficou estagnada.<br />

Uma situação muito parecida com a que o historiador Edward<br />

Gibbon descreveu para todo o Império do Oriente, cuja capital era<br />

Constantinopla:<br />

Num período de dez séculos, n<strong>em</strong> uma única descoberta foi feita para

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