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Carl Sagan, em "O mundo assombrado pelos demônios - Interessante

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filosofia islâmica medieval.<br />

Mas dogmas centrais da religião pod<strong>em</strong> ser testados cientificamente.<br />

Em si, esse fato leva alguns crentes e burocratas religiosos a desconfiar da<br />

ciência. Será a Eucaristia, como a Igreja ensina, muito mais do que uma<br />

metáfora fecunda, na realidade a carne de Jesus Cristo, ou será – química,<br />

microscopicamente e de outras maneiras – apenas uma hóstia que o padre dá<br />

ao fiel? * O <strong>mundo</strong> será destruído ao final do ciclo venusiano de 52 anos, a<br />

menos que seres humanos sejam sacrificados aos deuses? ** O judeu que por<br />

acaso não foi circuncidado leva uma vida pior do que seus colegas de religião<br />

que aceitam a antiga aliança pela qual Deus exige um pedaço do prepúcio de<br />

todo fiel masculino? Exist<strong>em</strong> seres humanos povoando inumeráveis outros<br />

planetas, como ensinam os Santos do Último Dia? Um cientista louco criou os<br />

brancos a partir dos negros, como afirma a Nação do Islã? O Sol realmente<br />

não nasceria se não se praticasse o rito de sacrifício hindu (o que o Satapatha<br />

Brahmana nos assegura que aconteceria)?<br />

Pod<strong>em</strong>os formar alguma idéia das raízes humanas da oração<br />

examinando as preces de religiões e culturas pouco familiares. Por ex<strong>em</strong>plo,<br />

eis o que está escrito numa inscrição cuneiforme sobre um selo cilíndrico<br />

babilônio do segundo milênio a.C: “Oh, Ninlil, Senhora das Terras, <strong>em</strong> teu<br />

leito nupcial, na morada de teu prazer, interceda por mim junto a Enlil, o teu<br />

amado. [Assinado] Mili-Shipak, Shatammu de Ninmah”.<br />

Já faz muito t<strong>em</strong>po que existiu um Shatammu <strong>em</strong> Ninmah, ou até<br />

mesmo uma Ninmah. Apesar do fato de Enlil e Ninlil ter<strong>em</strong> sido deuses<br />

importantes – pessoas <strong>em</strong> todo o <strong>mundo</strong> ocidental civilizado lhes dirigiram<br />

preces durante 2 mil anos –, o pobre Mili-Shipak estava na realidade orando<br />

para um fantasma, para um produto socialmente tolerado de sua<br />

imaginação? E, nesse caso, que dizer de nós? Ou isso é blasfêmia, uma<br />

questão proibida – como era com certeza entre os cultuadores de Enlil?<br />

A oração funciona realmente? Quais?<br />

Em certa categoria de oração, pede-se a Deus que intervenha na<br />

história humana ou corrija alguma injustiça, real ou imaginada, ou uma<br />

(*) Houve uma época <strong>em</strong> que a resposta a essa pergunta era uma questão de<br />

vida e morte. Miles Phillips era um marinheiro inglês, abandonado na colônia espanhola<br />

do México. Ele e seus companheiros foram conduzidos perante a Inquisição no ano de<br />

1574. “Se não acreditávamos que a hóstia de pão que o padre elevava acima de sua cabeça<br />

e o vinho que havia no cálice eram o verdadeiro, o perfeito corpo e sangue de nosso<br />

Salvador Jesus Cristo, sim ou não? Ao que”, acrescenta Phillips, “se não respondêss<strong>em</strong>os<br />

‘Sim!’, não nos restaria outro caminho senão a morte.”<br />

(**) Como esse ritual da América Central não t<strong>em</strong> sido praticado há cinco<br />

séculos, t<strong>em</strong>os a perspectiva de refletir sobre as dezenas de milhares de seres humanos,<br />

sacrificados voluntária ou involuntariamente aos deuses astecas e maias, que se<br />

conformavam com os seus destinos pela fé de que morriam para salvar o Universo.

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