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Carl Sagan, em "O mundo assombrado pelos demônios - Interessante

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Sócrates, faz perguntas <strong>em</strong>baraçosas <strong>em</strong> que não tínhamos pensado, ou<br />

d<strong>em</strong>onstra que varr<strong>em</strong>os para baixo do tapete pressupostos subjacentes de<br />

importância capital –, tal fato se torna muito mais do que uma busca do<br />

conhecimento. Nós o sentimos como um ataque pessoal.<br />

O cientista que pela primeira vez propôs consagrar a dúvida como<br />

uma virtude fundamental da inteligência indagadora deixou claro que ela<br />

não era um fim <strong>em</strong> si mesmo, mas uma ferramenta. René Descartes escreveu:<br />

Não imitei os céticos que duvidam apenas por duvidar, e fing<strong>em</strong> estar<br />

s<strong>em</strong>pre indecisos; ao contrário, toda a minha intenção foi chegar a uma<br />

certeza, afastar os sedimentos e a areia para chegar à pedra ou ao barro<br />

que está <strong>em</strong>baixo.<br />

Pela forma como o ceticismo é às vezes aplicado a questões de<br />

interesse público, há uma tendência para apequenar os opositores, tratá-los<br />

com ar de superioridade, ignorar o fato de que, iludidos ou não, os adeptos<br />

da superstição e da pseudociência são seres humanos como sentimentos reais<br />

que, como os céticos, tentam compreender como o <strong>mundo</strong> funciona e qual<br />

poderia ser o nosso papel nele. Em muitos casos, seus motivos se<br />

harmonizam com a ciência. Se a sua cultura não lhes deu todas as<br />

ferramentas necessárias para levar adiante essa grande busca, vamos<br />

moderar as nossas críticas com bondade. Nenhum de nós nasce plenamente<br />

equipado.<br />

Há certamente limites para os usos do ceticismo. Deve-se aplicar<br />

uma análise de custo/benefício, e se o alívio, o consolo e a esperança<br />

fornecidos pelo misticismo e pela superstição são elevados, e os perigos da<br />

crença relativamente baixos, por que não deveríamos guardar as dúvidas<br />

para nós mesmos? Mas a questão é delicada. Imagine que você entra num<br />

táxi numa grande cidade e, assim que se acomoda no carro, o motorista<br />

começa a discursar sobre as supostas iniqüidades e inferioridades de outro<br />

grupo étnico. O melhor a fazer é ficar calado, tendo <strong>em</strong> mente que qu<strong>em</strong> cala<br />

consente? Ou a sua responsabilidade moral é de discutir com o motorista,<br />

expressar a sua indignação, até mesmo sair do táxi – porque você sabe que<br />

cada consentimento silencioso será um estímulo para o próximo discurso, e<br />

que cada discordância vigorosa o levará a pensar duas vezes antes da<br />

próxima vez? Da mesma forma, se calamos d<strong>em</strong>ais sobre o misticismo e a<br />

superstição – mesmo quando parec<strong>em</strong> estar fazendo algum b<strong>em</strong> –,<br />

favorec<strong>em</strong>os um clima geral <strong>em</strong> que o ceticismo passa a ser considerado<br />

descortês, a ciência cansativa e o pensamento rigoroso algo insípido e<br />

inapropriado. Encontrar um equilíbrio prudente exige sabedoria.

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