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Carl Sagan, em "O mundo assombrado pelos demônios - Interessante

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para ver se têm valia. E, se estamos bastante desesperados, logo nos<br />

dispomos a abandonar o que pode ser visto como a pesada carga do<br />

ceticismo. A pseudociência fala às necessidades <strong>em</strong>ocionais poderosas que a<br />

ciência freqüent<strong>em</strong>ente deixa de satisfazer. Nutre as fantasias sobre poderes<br />

pessoais que não t<strong>em</strong>os e desejamos ter (como aqueles atribuídos aos superheróis<br />

das histórias de quadrinhos modernas e, no passado, aos deuses). Em<br />

algumas de suas manifestações, oferece satisfação para a fome espiritual,<br />

curas para as doenças, promessas de que a morte não é o fim. Renova nossa<br />

confiança na centralidade e importância cósmica do hom<strong>em</strong>. Concede que<br />

estamos presos, ligados ao Universo. * Às vezes parece uma parada no meio<br />

do caminho entre a antiga religião e a nova ciência, inspirando desconfiança<br />

<strong>em</strong> ambas.<br />

No âmago de algumas pseudociências (e também de algumas<br />

religiões, da Nova e da Antiga Era) reside a idéia de que é o ato de desejar<br />

que dá forma aos acontecimentos. Como seria agradável se pudéss<strong>em</strong>os, à<br />

s<strong>em</strong>elhança do folclore e das histórias infantis, satisfazer os desejos de nosso<br />

coração pelo simples ato de desejar. Como é sedutora essa noção,<br />

especialmente quando comparada com o trabalho duro e a boa sorte<br />

geralmente necessários para concretizar nossas esperanças. O peixe<br />

encantado ou o gênio da lâmpada nos conced<strong>em</strong> três desejos – o que<br />

quisermos, exceto aumentar o número de desejos. Qu<strong>em</strong> já não pensou – só<br />

por segurança, só para o caso de encontrarmos e acidentalmente esfregarmos<br />

uma velha e atarracada lâmpada de latão – no que pedir?<br />

L<strong>em</strong>bro-me de um mágico de cartola e bigodes que brandia uma<br />

bengala de ébano nos gibis e livros da infância. Seu nome era Zatara. Ele<br />

podia fazer qualquer coisa acontecer, qualquer coisa. Como o conseguia?<br />

Fácil. Ele pronunciava as ordens de trás para diante. Se ele queria 1 milhão de<br />

dólares, dizia “seralód ed oãhlim mu <strong>em</strong>-êd”. Só isso. Era como uma reza,<br />

mas com resultados muito mais seguros.<br />

Aos oito anos, passei bastante t<strong>em</strong>po experimentando esse filão,<br />

dando ordens para as pedras levitar<strong>em</strong>: “metivel, sardep”. Nunca funcionou.<br />

Eu punha a culpa na minha pronúncia.<br />

Pode-se afirmar que a pseudociência é adotada na mesma proporção<br />

<strong>em</strong> que a verdadeira ciência é mal compreendida – a não ser que a linguag<strong>em</strong><br />

(*) Embora eu ache difícil encontrar uma conexão cósmica mais profunda do<br />

que as descobertas espantosas da moderna astrofísica nuclear; à exceção do hidrogênio,<br />

todos os átomos que compõ<strong>em</strong> cada um de nós – o ferro no sangue, o cálcio nos ossos, o<br />

carbono no cérebro – foram fabricados <strong>em</strong> estrelas vermelhas gigantes a milhares de anosluz<br />

no espaço e a bilhões de anos no t<strong>em</strong>po. Somos feitos, como gosto de dizer, de matéria<br />

estelar.

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