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Carl Sagan, em "O mundo assombrado pelos demônios - Interessante

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forma que as verdades profundas são joeiradas dentre profundos disparates.<br />

O <strong>em</strong>preendimento coletivo do pensamento criativo e do pensamento cético,<br />

atuando <strong>em</strong> conjunto, mantém a ciência <strong>em</strong> andamento. No entanto, há certa<br />

tensão nessas duas atitudes aparent<strong>em</strong>ente contraditórias.<br />

Considere-se a seguinte afirmação: enquanto caminho, o t<strong>em</strong>po –<br />

medido pelo meu relógio de pulso ou pelo meu processo de envelhecimento<br />

– atrasa. E também encolho na direção do movimento. E também me torno<br />

mais pesado. Qu<strong>em</strong> já test<strong>em</strong>unhou uma coisa dessas? É fácil rejeitar tal<br />

afirmação s<strong>em</strong> d<strong>em</strong>ora. Eis outra: <strong>em</strong> todo o Universo, a matéria e a<br />

antimatéria estão sendo criadas a partir do nada o t<strong>em</strong>po todo. Eis uma<br />

terceira: uma vez na vida, outra na morte, o carro passará espontaneamente<br />

pela parede de tijolos da garag<strong>em</strong> e será encontrado na rua na manhã<br />

seguinte. São todas afirmações absurdas! Mas a primeira é uma declaração da<br />

relatividade especial e as outras duas são conseqüências da mecânica<br />

quântica (flutuações no vácuo e efeito túnel, * como são chamadas). Goste-se<br />

ou não, o <strong>mundo</strong> é assim. Se insistirmos que é ridículo, nos fechar<strong>em</strong>os para<br />

s<strong>em</strong>pre a algumas das principais descobertas sobre as leis que reg<strong>em</strong> o<br />

Universo.<br />

Se somos apenas céticos, as novas idéias não consegu<strong>em</strong> penetrar<br />

<strong>em</strong> nossa mente. Nunca aprend<strong>em</strong>os nada. Nós nos tornamos misantropos<br />

mal-humorados, convencidos de que a tolice governa o <strong>mundo</strong>. (Há, s<strong>em</strong><br />

dúvida, muitos dados que confirmam essa opinião.) Como as grandes<br />

descobertas nas fronteiras da ciência são raras, a experiência tenderá a<br />

confirmar a nossa rabugice. Mas de vez <strong>em</strong> quando uma nova idéia prova ter<br />

acertado o alvo, é válida e maravilhosa. Se somos decidida e inflexivelmente<br />

céticos, vamos perder (ou ficar ressentidos com) as descobertas<br />

transformadoras na ciência, e <strong>em</strong> qualquer das duas hipóteses estar<strong>em</strong>os<br />

obstruindo a compreensão e o progresso. O mero ceticismo não basta.<br />

Ao mesmo t<strong>em</strong>po, a ciência requer o ceticismo mais vigoroso e<br />

intransigente, porque a imensa maioria das idéias está simplesmente errada, e<br />

a única maneira de separar o joio do trigo é pela análise e experiência críticas.<br />

Se somos tão abertos a novas idéias a ponto de ser crédulos, e se não t<strong>em</strong>os<br />

um micrograma de senso cético, não pod<strong>em</strong>os distinguir as idéias<br />

promissoras das que pouco val<strong>em</strong>. Aceitar acriticamente toda noção, idéia e<br />

hipótese professada equivale a não conhecer nada. As idéias se contradiz<strong>em</strong><br />

umas às outras; somente pelo exame cético pod<strong>em</strong>os decidir entre elas.<br />

Algumas são de fato melhores do que outras.<br />

A mistura judiciosa desses dois modos de pensar é essencial para o<br />

* O t<strong>em</strong>po médio de espera para cada exsudação estocástica é muito maior do<br />

que a idade do Universo desde o Big Bang. Mas, <strong>em</strong>bora improvável, poderia acontecer<br />

amanhã.

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