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Narrativas Gráficas em Contextos Pediátricos<br />
Ricardo Garcia<br />
Unidade Local de Saúde do Alto Minho<br />
ricardo.garcia@ulsam.min-saude.pt<br />
Resumo - A expressão artística das crianças assumiu interesse científico a partir do século<br />
XX, embora sob ângulos psicologizantes e perpetuando a relegação das crianças à condição<br />
de seres humanos inacabados. Os desenhos são considerados meios de transmissão de<br />
significados e a produção artística pelas crianças como afirmação cultural por direito próprio.<br />
Os campos teóricos que nortearam a investigação foram a Sociologia da Infância, a Cultura<br />
Visual e a teoria das Representações Sociais. O design metodológico foi de base qualitativa<br />
e interpretativa. As principais conclusões surgiram no decurso da observação dos desenhos<br />
e do modelo de análise. Procurou-se, por esta via, responder à questão: que representações<br />
têm as crianças hospitalizadas acerca do internamento pediátrico?<br />
Procedeu-se à recolha de artefactos visuais produzidos por crianças de vários países,<br />
visando perceber a produção, usos e interpretações daqueles artefactos, sendo certo que os<br />
métodos de pesquisa baseados na recolha de artefactos visuais são adequados à<br />
investigação realizada com crianças.<br />
As narrativas gráficas veiculadas pelas crianças são enquadráveis em quatro campos,<br />
denominados de Mundos: o Mundo Manifesto, o Mundo Descoberto, o Mundo Humano e o<br />
Mundo Simbólico. A Subjetividade e o Imaginário surgem como suporte indissociável das<br />
narrativas veiculadas.<br />
Palavras-chave: Sociologia da Infância, Desenhos, Narrativas, Pediatria, Culturas da<br />
Infância.<br />
O crescimento das áreas urbanas assume contornos de irreversibilidade. Dados da UNICEF<br />
(2012) garantem que em meados deste século sete em cada dez pessoas viverão em cidades.<br />
O número de habitantes das zonas urbanas cresce em cerca de sessenta milhões por ano. O<br />
número de crianças que vive em contextos urbanos excede os mil milhões.<br />
Se é inegável que as cidades poderiam oferecer melhores condições para a defesa e<br />
salvaguarda dos direitos das crianças, não é menos verdade que os contextos urbanos oferecem<br />
maiores riscos para a infância. São contextos permeáveis às assimetrias sociais e ao surgimento<br />
de focos de exclusão social e marginalidade. Estas realidades resultam da expansão das cidades<br />
para além da cobertura dos serviços e das infraestruturas, e muitas vezes para além das<br />
possibilidades da cidadania.<br />
As discrepâncias sociais dos contextos urbanos são determinantes da saúde pública e do bemestar<br />
das populações e indivíduos. Uma conceção holística da saúde contempla vetores sociais,<br />
económicos, políticos e ambientais para além dos meramente clínicos. Portanto, os contextos<br />
hospitalares, habitualmente localizados nas principais cidades, são janelas privilegiadas para a<br />
identificação de patologias sociais. Lamentavelmente, a natureza dos cuidados prestados nos<br />
hospitais, em circunstâncias de agudização de doença, oferece pouco tempo para um olhar mais<br />
demorado sobre aquelas patologias.<br />
Em sentido inverso, esta comunicação procura o olhar das crianças sobre os hospitais,<br />
encontrando fundamento em investigação realizada no âmbito do Mestrado em Sociologia da<br />
Infância na Universidade do Minho (Garcia, 2012). Aquela investigação pretendia captar as<br />
representações sociais face à realidade hospitalar, mas viabilizou outras reflexões no campo dos<br />
direitos das crianças e propostas de redefinição de políticas sociais.<br />
Propôs-se a crianças hospitalizadas que desenhassem o hospital. A recolha dos dados foi<br />
alargada a vários países através de parcerias com unidades hospitalares com atendimento<br />
pediátrico. Foram envolvidas apenas crianças cuja condição clínica não oferecesse qualquer<br />
impedimento à participação e, sempre que possível, com o seu consentimento informado.<br />
A opção por desenhos resultou do facto de estes serem considerados meios privilegiados de<br />
transmissão de significados (Stanczak, 2007). Porém, o que determina a qualidade daquela<br />
transmissão é a forma como os desenhos são interpretados pelos seus autores e não tanto a<br />
sua qualidade técnica. Os desenhos realizados por crianças possuem intencionalidade (Cox,<br />
2005), reconhecendo-se também a importância dos contextos culturais e o que deles é<br />
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