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dificuldade de identidade e criação de vínculo. Ao serem indagadas a respeito, as monitoras<br />

falaram que esse era um hábito necessário para manter a hierarquia e a disciplina na casa.<br />

Configurou-se então uma tensão inquietante para os extensionistas. Eles sentiam-se<br />

premidos entre a necessidade de planejamento das oficinas e brincadeiras (levando-se em conta<br />

sua adequação, no sentido de instigar o brincar criativo e autônomo para crianças diferentes e<br />

de diferentes idades) e outra necessidade, a de dar à criança protagonismo na brincadeira,<br />

mesmo com um adulto envolvido. Foram as discussões e reflexões em supervisão e as<br />

sucessivas experiências na instituição que possibilitaram aos extensionistas lidar com a<br />

frustração das oficinas não acontecerem exatamente como planejadas. Essa frustração era<br />

mitigada na medida em que percebiam que o objetivo das oficinas não era a realização de uma<br />

série de atividades previamente organizadas, mas mobilizar o brincar criativo e autônomo da<br />

criança. Planejar, instigar, participar, mas não dirigir a brincadeira, depende de uma<br />

compreensão complexa das relações na situação do brincar e não tem um manejo fácil. Nesse<br />

sentido, a experiência proporcionada pela extensão tem uma dimensão importante na formação<br />

dos alunos e, em uma jornada conjunta, o aprendizado dos extensionista em oferecer o<br />

protagonismo da brincadeira para as crianças vai se coadunando com o aprendizado das<br />

crianças de exercerem esse protagonismo.<br />

Vale aqui ressaltar um aspecto mais pontual das intervenções, e que, aparentemente<br />

simples, foi um dispositivo que se mostrou interessante para ajudar as crianças na sua<br />

organização espaço-temporal e a diferenciar esse momento das situações de brincadeiras na<br />

casa. A introdução de uma cantiga infantil (seja antiga, seja atual) cantada para marcar o início<br />

das atividades, era utilizada a fim de reunir as crianças em uma roda, momento em que se<br />

conversava sobre as atividades do dia. Assim, após as cantigas, dava-se início às atividades,<br />

que tinham duração aproximada de uma hora.<br />

Ao final de pouco mais de dois anos de intervenções, foram observadas algumas<br />

mudanças de comportamento em todas as crianças participantes das oficinas, apesar de certa<br />

rotatividade na instituição. A primeira grande mudança foi em relação à sua organização local e<br />

postural. No primeiro dia de oficina, nem todas entenderam porque os alunos estavam ali,<br />

sentados em roda, cantando músicas que nem sempre eram de seu interesse ou conhecimento.<br />

Aos poucos, não somente a formação da roda partia delas mesmas, como também a escolha<br />

das músicas, os pedidos para os alunos levarem música em formato de DVD ou então CD para<br />

ouvirem juntos; quando deixavam a atividade mais livre, a formação em roda era exigida por<br />

algumas crianças, assim como a organização dos brinquedos também começou a partir delas.<br />

À medida que os alunos tiveram a oportunidade de explicar melhor o seu trabalho para<br />

as monitoras e a demonstrar interesse não apenas nas atividades do projeto, mas também em<br />

ajudar nas atividades cotidianas da casa que, pelo descompasso eventual entre o número<br />

reduzido de monitoras e excessivo de crianças, constituíam com freqüência situações difíceis de<br />

conduzir – fosse à hora de trocar, de dar comida ou de auxiliar na mediação de conflitos –, a<br />

rigidez existente no local começou a ser rompida. Já ao final do primeiro ano, observamos que<br />

o projeto passou a ser mais bem compreendido e a presença das extensionistas não causava<br />

mais estranhamento ou mobilizava resistências, tanto pelas monitoras, como pela instituição.<br />

A continuidade das oficinas colocou o brincar em outra perspectiva e as monitoras<br />

dispunham-se a estar com mais frequência nas oficinas e acompanhar o trabalho dos alunos. O<br />

projeto foi ganhando sentido para as monitoras, que passaram a identificar os extensionistas não<br />

mais como voluntários “voláteis”, mas como interlocutores. Começaram, pois, a reconhecer a<br />

extensão como um projeto coeso, permanente e fundamentado. Consideramos que esse<br />

processo, relativamente longo, de favorecer que as monitoras (que lidam direta e cotidianamente<br />

com as crianças) tivessem mais clareza do projeto e da importância de sua participação nele<br />

fazia parte do nosso trabalho.<br />

A modificação do brincar e o brincar compartilhado que passou a fazer parte do cotidiano<br />

das crianças provocou repercussões na rotina da casa que, muitas vezes, foi alterada em função<br />

da presença dos alunos, e foram importantes para o reconhecimento da extensão como um<br />

projeto parceiro dentro da instituição.<br />

Essas mudanças experimentadas ao longo da realização do projeto inauguraram novos<br />

espaços e desafios para o aprofundamento das ações. Dois aspectos nos chamaram<br />

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