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múltiplas reflexões e estudos. A forma como se promove a participação das crianças nas sociedades<br />

democráticas está ainda em debate, especialmente se considerarmos níveis em que as próprias<br />

reivindicam os seus espaços de participação e dirigem estes processos autonomamente.<br />

Os movimentos de emancipação das crianças do início do século XX vieram reclamar direitos que<br />

surgiram da análise das suas condições de vida, fortalecendo a sua posição na sociedade. A<br />

Declaração de Moscovo de 1918 foi o movimento pioneiro que enfatizou a educação livre para as<br />

crianças, sublinhando direitos como o da expressão livre da sua opinião e a organização coletiva,<br />

com outras crianças e adultos, e o da participação em decisões políticas (Gaitán & Liebel, 2011).<br />

Na atualidade, a CDC e o programa “Cidades Amigas das Crianças”, lançado pela UNICEF em 1996<br />

com o objetivo de “colocar as crianças em primeiro lugar” e contribuir para a aplicação dos seus<br />

direitos no contexto mais próximo da sua vida quotidiana – o município, refletem uma ordem social<br />

desejada e definem a posição das crianças na sociedade como sujeitos de direitos e dos adultos<br />

como defensores desses mesmos direitos. Mas será que os adultos, especialmente os responsáveis<br />

políticos, reconhecem a infância e a juventude como parte ativa da vida sociopolítica, económica e<br />

cultural existente? Como cidadãs e cidadãos de pleno direito, com algo a dizer sobre a sociedade<br />

em que vivem?<br />

A cidadania como prática implica “ser parte de”, recebendo o estatuto de membro da comunidade,<br />

compartilhando interesses, direitos e responsabilidades. Consciente dos baixos níveis de<br />

participação cidadã dos grupos sociais mais excluídos, nos quais se inserem as crianças, este<br />

trabalho tem por objetivo refletir sobre como se pode, à escala local, promover e operacionalizar a<br />

participação e a cidadania ativa das crianças, envolvendo-as nos vários sistemas da comunidade,<br />

aumentando o conhecimento e a consciência dos seus direitos a partir de ações educativas<br />

participativas e da exploração territorial das suas freguesias. É ainda explicado como é possível<br />

despertar sentimentos de pertença a um território e abordadas as condições políticas necessárias<br />

para que, a partir das crianças, se desenvolvam práticas de democracia participativa. As reflexões<br />

aqui propostas têm como fio condutor as observações e análises realizadas no âmbito do projeto<br />

Uma Aventura no Mundo da Cidadania, com três grupos de crianças do concelho de Gouveia, com<br />

idades compreendidas entre os 4 e os 12 anos, que despoletaram percursos de participação infantil<br />

nas suas freguesias.<br />

As crianças como ponto de partida para a ampliação da cidadania<br />

O art.º 12 da CDC - as “crianças têm o direito de exprimir livremente a sua opinião sobre questões<br />

que lhe digam respeito e de ver essa opinião tomada em consideração, de acordo com a sua idade<br />

e maturidade” inaugurou uma visão das crianças como cidadãs e atores políticos, abrindo<br />

possibilidades à participação infantil. A investigação com base nos direitos das crianças posiciona<br />

as crianças como sujeitos, cidadãos ativos do presente (Jans, 2004, Sarmento, 2012), capazes,<br />

competentes e especialistas nas suas próprias vidas (Lansdown, 2005). No entanto, a natureza e<br />

extensão da participação das crianças depende muitas vezes da perceção dos adultos relativamente<br />

à competência associada a crianças de diferentes idades ou etapas de desenvolvimento. De facto,<br />

as crianças podem ser excluídas dos processos de participação por causa da perceção acerca das<br />

suas competências, o que acontece muitas vezes com crianças mais novas (Dockett, Kearney &<br />

Perry, 2012). O que reforça a ideia de que:<br />

“A infância é especialmente prejudicada, entre todos os grupos e categorias sociais excluídas,<br />

quer pela relativa invisibilidade face às políticas públicas e aos seus efeitos, quer por que é<br />

geralmente excluída do processo de decisão na vida colectiva” (Sarmento, Fernandes &<br />

Tomás, 2007:183).<br />

De acordo com a Escada de Participação proposta por Hart (1992), os níveis de participação das<br />

crianças passam por etapas de não participação (manipulação, decoração e tokenismo<br />

[simbolismo]) e etapas de participação (delegação com informação, consulta e informação, iniciativa<br />

adulta com partilha de decisões com a criança, processo iniciado e dirigido pelas crianças). A<br />

participação é um direito fundamental da cidadania e um meio pelo qual se constroem as<br />

democracias; e segundo o mesmo autor:<br />

“Através da participação genuína em projetos que envolvem soluções a problemas reais as<br />

crianças e jovens desenvolvem competências de reflexão crítica e comparam perspetivas que<br />

são essenciais para a autodeterminação relativamente a crenças políticas” (Hart, 1992:36).<br />

O entendimento das crianças e jovens como atores políticos inteiros e plenos, bem como os projetos<br />

de cidadania ativa que colocam as crianças no centro da criação de sistemas de democracia local<br />

de alta intensidade, ressentem-se também da patologia de representação das democracias (Santos,<br />

2003). De facto, a degradação das práticas democráticas, o descrédito e a desqualificação da<br />

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