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alterarem (ou não) as suas próprias realidades sociais. As representações que fizeram dos<br />

principais problemas existentes no bairro – e na escola – e as perspetivas de futuro apresentadas<br />

constituíram o ponto de partida para uma reflexão, com estas mesmas crianças, sobre uma possível<br />

intervenção nestes territórios, através de um processo de estimulação à criação de competências<br />

de participação, questionamento e ação potencializadoras de autonomia.<br />

Durante o percurso recorremos à sociologia da infância e às suas premissas que encaram a criança<br />

como um ser social com direitos reconhecidos (Fernandes, 2005), como um indivíduo detentor de<br />

uma voz própria capaz de construir a sua própria história (Sarmento, 2000).<br />

Ao longo deste processo, em que nos deixamos conduzir pela sociologia da infância, convidamos a<br />

criança a participar ativamente na investigação, procurando ouvir o que tinha para dizer, trazendoa<br />

para a discussão com o objetivo de criar espaços de construção coletiva. Como refere Corsaro,<br />

as crianças não se limitam a interiorizar o que a sociedade dos adultos lhe proporciona, mas dão<br />

um contributo ativo, sendo que “criam e participam de suas próprias e exclusivas culturas de pares<br />

quando selecionam ou se apropriam criativamente de informações do mundo adulto para lidar com<br />

suas próprias e exclusivas preocupações” (Corsaro, 2011:31).<br />

O conhecimento sobre a infância que nos propusemos aprofundar tornou-se possível porque<br />

encaramos as crianças como atores em sentido pleno, simultaneamente “produtos e atores dos<br />

processos sociais” (Sirota, 2001). Procuramos compreender o que a criança produz na “intersecção<br />

de suas instâncias de socialização” e não o que produz nas instituições em que se move,<br />

nomeadamente na escola e na família (Sirota, 2001).<br />

A sociologia da infância e as suas premissas possibilitaram-nos uma abordagem participativa da<br />

infância mas, o facto de as crianças que nos propusemos estudar se encontrarem inseridas em<br />

territórios com características muito específicas, sentimos necessidade de recorrer à sociologia<br />

urbana com vista a compreender determinados fenómenos associados a estes contextos.<br />

O contributo da sociologia urbana para o presente estudo prende-se com a necessidade de entender<br />

as relações entre os indivíduos e o espaço. Perceber as interações e o palco onde estas se<br />

desenrolam, neste caso o bairro de habitação social, enquanto fator de distinção social, permite-nos<br />

compreender melhor os habitantes destes territórios. Os seus pressupostos ajudam-nos a<br />

enquadrar os atores desta investigação no contexto espacial, com características tão próprias, como<br />

é o bairro. Como refere Castells, o sistema urbano é um conceito tendo como “única utilidade a de<br />

esclarecer as práticas sociais, as situações históricas concretas, ao mesmo tempo para<br />

compreendê-las e deduzir suas leis” (Castells, 1983:294).<br />

Tendo como palco a “interação social dos indivíduos e grupos” a sociologia urbana permite uma<br />

“pesquisa mais ampla sobre a natureza das relações sociais contemporâneas nos seus<br />

enquadramentos contextuais” (Warde et al, 2002:30). Esta contextualização emerge como<br />

indispensável para compreender o nosso objeto de estudo, enquadrando-o sob uma perspetiva<br />

social, mas também espacial. A sociologia urbana ajuda-nos neste processo na medida em que se<br />

debruça sobre a dimensão urbana de diversas áreas e aspetos da vida social, refletindo sobre o<br />

modo como se articulam no contexto urbanizado, nomeadamente sobre como se estruturam as<br />

relações entre atores, instituições e grupos sociais (Grafmeyer, 1994).<br />

Bairro Social: Muitos Mundos Dentro de Um Só Mundo<br />

No sentido de melhor compreendermos o contexto do nosso objeto de estudo sentimos necessidade<br />

de estudar os bairros de habitação social em que vivem e/ou se movem os atores da nossa<br />

investigação, na perspetiva de que estes territórios nos ajudem a perceber algumas das dinâmicas<br />

que lhes estão associadas.<br />

A construção dos principais bairros sociais da cidade do Porto remonta ao ano de 1956, data que<br />

marcou o arranque do “Plano de Melhoramentos para a Cidade do Porto” (PMCP). Responsável<br />

pela construção dos principais bairros sociais da cidade do Porto, o PMCP tinha como principal<br />

objetivo o alargamento e expansão da cidade de modo controlado, com vista a melhorar a imagem<br />

da Invicta após a “libertação de terrenos no centro da cidade tão cheio das denunciadoras ilhas”<br />

(Ribeiro, 1979:28).<br />

Durante este período foram edificados cerca de 13 novos bairros, onde se concentraram mais de 6<br />

000 habitações, “concretizando a maior e mais sistémica operação de rejeição para a periferia de<br />

populações urbanas de nível de vida mais baixo” (Ribeiro, 1979:29). De todos os bairros que,<br />

durante este período, foram criados no Porto, apenas dois foram construídos no centro da cidade.<br />

Os restantes foram edificados na periferia em locais onde existiam acessos rodoviários recémcriados<br />

ou previstos para breve (Pereira, 2009:6). Cerca de 15% a 20% da população – a grande<br />

maioria vivia em ilhas – foi transferida do centro para a periferia (Pereira, 2003:6).<br />

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