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CONVERSAS COM SOCIÓLOGOS BRASILEIROS ... - GV Pesquisa

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ninguém sair para o recreio. Até hoje eu não entendi como é que tive coragem de perguntar<br />

a ela, deve ter sido o meu primeiro e único ato de coragem cívica: “ Por que a senhora disse<br />

que a gente não pode sair?” ela respondeu: “Porque sujaram isto, fizeram aquilo, etc. Eu<br />

retruquei: “Mas, porque é que ninguém pode sair”. “Os inocentes pagam pelos pecadores”.<br />

Eu fiquei estarrecido com a resposta, porque não fazia parte da minha referência. E até hoje<br />

estou estarrecido, porque isto legitima qualquer coisa. Se os inocentes pagam pelos<br />

pecadores, então, Deus está morto. É uma forma de dizer que não se tem nenhuma saída.<br />

Era uma professora adorável. Não é qualquer forma de cultura que tem este tipo de<br />

concepção. “ Ah seus judeus desgraçados, vocês fizeram uma sacanagem com Jesus, agora<br />

paguem.” Uma das brigas culturais milenares é esta. Por que é que eu tenho de estar<br />

pagando agora, porque um determinado sacerdote, que fazia parte de um dos grupos<br />

políticos daquela época fez este tipo de coisa. O outro diz, não senhor, o senhor vai pagar.<br />

E esta é uma diferença cultural real. É a famosa culpa que eu sou portador? Eu nasci,<br />

exatamente, no dia em que em Munique se reuniram os chefes de Estado europeus na<br />

prática de dar sinal verde para o Hitler fazer a sua (?). Em setembro de 38. Até hoje apenas<br />

me pergunto, por que diabo, eu não fiz nada? Nenhuma manifestação. Nenhum esforço meu<br />

para que aquilo acontecesse. Eu tenho certa culpa por isto. Por não ter feito nada em relação<br />

àquela reunião que estava ocorrendo no dia do meu nascimento(?). Pela minha omissão. Eu<br />

não fiz nada. É verdade que eu reclamei, mas, ninguém entendeu. A culpa judaica era isto.<br />

Esta minha era exacerbada. Até pode existir, mas, não tem a ver nada com este mecanismo<br />

de punição. Tem sim a ver com uma espécie de compulsiva internalização do nós. O<br />

Adorno tem uma frase que conta (?), em Crime na Muralha, aquelas histórias, coisas<br />

pequenas. Interessante, ele estava em uma em Los Angeles e foi a uma recepção na casa do<br />

(?). Ele estava ali, ele adorava estas coisas, mas, era meio gauche na sua conduta. Mas,<br />

enfim, foi apresentado a um ator. Ele estende a mão e o cara também, só que a mão do cara<br />

era artificial, mecânica. No que ele viu isto, perdeu o controle e recuou a própria mão que<br />

ele tinha estendido. O (?) percebeu isto e imediatamente entrou em cena e fez a imitação<br />

disto de uma maneira talentosa. As pessoas riram e dissipou o mal estar. O Adorno diz, o<br />

que eu fiz? Eu recuei a mão, porque é nos pequenos gestos que está o germe da injustiça.<br />

Esta é a concepção básica, e ela é que está associada ao que chamamos cultura da culpa,<br />

que é meio caricatural. Para mim é a caricatura ao extremo. Mas, a chamada cultura da<br />

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