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O Atlântico Açoriano - Musa - Universidade Federal de Santa Catarina

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Não há dúvidas que o termo “manezinho” foi “ressemantizado” como diz Rial (op.<br />

cit: 19) ou simbolicamente invertido como trata Fantin (2000: 170), passando <strong>de</strong> categoria <strong>de</strong><br />

acusação a categoria <strong>de</strong> elogio. Estas valorações <strong>de</strong> tipos culturais são comuns em<br />

movimentos <strong>de</strong> reconstrução i<strong>de</strong>ntitária como aquele do “black is beatiful” dos anos 60. Elas<br />

remetem às formas <strong>de</strong> apropriação e emblematização <strong>de</strong> categorias nativas por setores<br />

elitizados e/ou mobilizados. Tais categorias, acabam por tornar-se símbolos regionais ou<br />

nacionais e passam a ser consi<strong>de</strong>radas “naturais” 29 . Eu acrescentaria que é preciso ter cautela<br />

com essas naturalizações no sentido da análise do observador. Ela po<strong>de</strong> ficar comprometida<br />

com elaborações muito exteriores, fazendo presumir que o objeto <strong>de</strong> pesquisa não tenha mais<br />

dados a oferecer. No caso em tela, note que o mané como categoria pejorativa, continua<br />

sendo expressão comum nas localida<strong>de</strong>s, o que atestei em minhas pesquisas <strong>de</strong> campo 30 .<br />

Aquele homem ou mulher “tolos”, “anacrônicos” continua a valer como forma <strong>de</strong> tratamento<br />

no meio nativo, <strong>de</strong> modo que a velha semântica do “matuto” funciona, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente<br />

das construções dos analistas ou das apropriações das elites. Além disso, por baixo da sua<br />

figura iconizada, o “manezinho” po<strong>de</strong> ser também aquele “<strong>de</strong>voto (a)” ou “farrista”, um<br />

“mandrião” (o boêmio) ou “doutor”, um “velho” ou “pirralho”, uma “bruxa” ou “benze<strong>de</strong>ira”,<br />

“pescador” ou “ren<strong>de</strong>ira” etc. De todo modo, a significação <strong>de</strong> "mané" é mesmo ambígua,<br />

entre o elogio e a crítica, a aceitação e a rejeição, on<strong>de</strong> ego (o que acusa/elogia) assume uma<br />

postura entre o "provincianismo" ("paroquialismo") e o "cosmopolitanismo". Ambigüida<strong>de</strong>s<br />

semelhantes caracterizam a avaliação da maioria das i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s regionais/estaduais no Brasil<br />

("gaúcho", "baiano", "mineiro", "pau <strong>de</strong> arara"). Eventualmente, o "carioca" se i<strong>de</strong>ntificando e<br />

sendo i<strong>de</strong>ntificado com o pólo "nacional" e portanto é assumido como "cosmopolita".<br />

29 Para um maior <strong>de</strong>talhamento do caso do mané nesta perspectiva, veja Fantin, (op. cit: cap. 4). Cf. também a<br />

sua bibliografia atinente para casos nacionais sobejamente estudados , como o do malandro, o Zé Carioca, a<br />

feijoada, símbolos da República etc. Cf. também Amante (op. cit.), livro com biografias e <strong>de</strong>poimentos <strong>de</strong><br />

manezinhos sobre o que é ser manezinho.

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