30.10.2014 Views

O Atlântico Açoriano - Musa - Universidade Federal de Santa Catarina

O Atlântico Açoriano - Musa - Universidade Federal de Santa Catarina

O Atlântico Açoriano - Musa - Universidade Federal de Santa Catarina

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

234<br />

Agora bem, valendo-me da estratégia utilizada por Geertz em "Negara" (1989:17),<br />

associei fontes bibliográficas históricas a dados etnográficos coletados em primeira mão para<br />

reconstituir o passado histórico dos ilhéus, em uma perspectiva <strong>de</strong> quem narra no tempo<br />

presente. Alternando os tempos verbais em uma narrativa que não abdica do tempo<br />

psicológico do narrador (NUNES, 1988), tentei recriar o modo <strong>de</strong> vida ilhéu para, em seguida,<br />

<strong>de</strong>screver brevemente o calendário atual das festas e ritos locais. Evi<strong>de</strong>nciei como estes<br />

eventos <strong>de</strong>marcam tempos sociais que pulsam alternativamente: o “tempo <strong>de</strong> trabalho” e o<br />

“tempo <strong>de</strong> festa”; a época da “política” e a do “choro aos mortos”; o tempo das “promessas”<br />

e o das “farras do boi”, a “época” da tainha e a da farinhada; o ciclo do “Divino” e o dos<br />

“Ternos <strong>de</strong> Reis”.<br />

Já foi dito (BRANDÃO, 1989: 7-42) que as festas populares brasileiras constituem<br />

cenários para trocas generalizadas. No caso da Ilha <strong>de</strong> <strong>Santa</strong> <strong>Catarina</strong>, troca-se a <strong>de</strong>voção e as<br />

promessas pelas bênçãos e graças atendidas, como nas Procissões do Senhor dos Passos e<br />

festas do Divino. No caso do Boi <strong>de</strong> Mamão, trocam-se as performances da dança por olhares<br />

cativos das crianças. E no caso da farra do boi, troca-se a coragem pelo aplauso (ou apupos<br />

jocosos).<br />

Analisando a estrutura da festa popular no Brasil, Brandão (op. cit. 8) a <strong>de</strong>fine como<br />

um “lugar simbólico on<strong>de</strong> cerimonialmente separam-se o que <strong>de</strong>ve ser esquecido e, por isso<br />

mesmo, em silêncio não festejado, e aquilo que <strong>de</strong>ve ser resgatado da coisa ao símbolo, posto<br />

em evidência <strong>de</strong> tempos em tempos, comemorado, celebrado”. Nesta perspectiva, a festa<br />

aparece como um espaço transicional, que <strong>de</strong>marca o tempo, restabelece laços, exagera o real<br />

e transfigura os sujeitos. Por isso, a festa é um lugar <strong>de</strong> metáforas e da memória. Um<br />

acontecimento extra-ordinário “que se apossa da rotina e não rompe mas, exce<strong>de</strong> sua lógica, e<br />

é nisso que ela força as pessoas ao breve ofício ritual da transgressão” (p.9).

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!