O Atlântico Açoriano - Musa - Universidade Federal de Santa Catarina
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vereador é um do executivo também e que po<strong>de</strong> ajudar como se fosse. Mas o vereador só faz<br />
leis e tem pouco po<strong>de</strong>r”. Disse então que tem mostrado aos seus eleitores, principalmente da<br />
comunida<strong>de</strong> on<strong>de</strong> vive, que, como secretário, po<strong>de</strong> ajudar mais. Disse que os pedidos são<br />
incontáveis e que a maioria são <strong>de</strong> remédio e emprego. Brincou dizendo que sabe até quantos<br />
votos po<strong>de</strong>rá obter, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ndo do favor que presta a cada beneficiado. A mulher do vereador<br />
local chegou dizendo que uma senhora lhe indagou na rua, “com as mãos na cintura”: “Mas<br />
quando é que ele vai empregar essa gente toda?” Ela, a mulher do vereador, estava irritada,<br />
porque, segundo me disse, ele já havia arrumado emprego para mais <strong>de</strong> 20 pessoas da<br />
Freguesia. “É que é preciso encaixar o currículo com a vaga. E ele tem mais <strong>de</strong> 50 currículos<br />
no seu gabinete e tem muita cobrança”. O pai da entrevistada, que estava por perto, disse:<br />
“Ela é ignorante e invejosa. Diga a ela que ele só vai arrumar emprego a quem votou em<br />
confiança, não um voto qualquer”. Ela respon<strong>de</strong>u: “Não, pai, assim vai ser mais complicado.<br />
Ele tem que ajudar <strong>de</strong> qualquer jeito”. Perguntei ao político se ele negaria algum pedido da<br />
prefeita. Ele disse que nunca o faria, pois tem que estar sempre junto aos que <strong>de</strong>têm o maior<br />
po<strong>de</strong>r. Acredito que se ele vacilar neste trabalho <strong>de</strong> “ajuda”, per<strong>de</strong>rá prestigio ou “força” e a<br />
comunida<strong>de</strong> procurará por outro. Ele trabalha com uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong> cabos eleitorais, sendo o voto<br />
a moeda corrente por parte dos eleitores. O universo das relações <strong>de</strong> troca engloba o voto<br />
como termo <strong>de</strong> troca em si, incluindo favores ou, como dizem ali, “ajudas”, facilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />
acesso à burocracia oficial, obtenção <strong>de</strong> patrocínios, transportes coletivos, prendas para festas,<br />
socorro em caso <strong>de</strong> doença etc.<br />
A obrigação e forma <strong>de</strong> ajudar (do doador) e a contra-obrigação e forma <strong>de</strong> “pagar”<br />
(do donatário) po<strong>de</strong>m variar <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o reconhecimento público, até o voto, a bajulação,<br />
promessas, presentes, visitas, serviços ou bens gratuitos etc. Tais relações <strong>de</strong> troca são<br />
influenciadas pela posição da pessoa nas re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> relações <strong>de</strong> parentesco, afinida<strong>de</strong> e<br />
vizinhança. Espera-se, portanto, que quanto mais próxima a pessoa estiver da re<strong>de</strong> <strong>de</strong> relações