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O Atlântico Açoriano - Musa - Universidade Federal de Santa Catarina

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CAPITULO 4 – O “BOI, O “DIVINO” E A “TAINHA” : AS FORMAS DE<br />

SOCIABILIDADE ILHA DE SANTA CATARINA<br />

4.1 - NOTA PRELIMINAR<br />

Este capítulo objetiva uma contribuição ao estudo antropológico das relações sociais<br />

entre os açoriano-<strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes na Ilha <strong>de</strong> <strong>Santa</strong> <strong>Catarina</strong>. O objetivo é realizar uma etnografia<br />

das formas locais <strong>de</strong> sociabilida<strong>de</strong>, através da observação e análise <strong>de</strong> eventos rituais<br />

significativos. Especificamente – e partindo das pesquisas acumuladas sobre as populações<br />

locais –, pretendo fazer uma <strong>de</strong>scrição etnográfica das suas formas <strong>de</strong> interação, englobando<br />

diversos aspectos do comportamento social cotidiano que estão imbricados indistintamente,<br />

seja em relações <strong>de</strong> parentesco 1 , seja em relações <strong>de</strong> troca e patronagem, em relações jocosas,<br />

1 Em vinte anos <strong>de</strong> acumulação <strong>de</strong> dados etnográficos sobre as populações açoriano-<strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes em <strong>Santa</strong><br />

<strong>Catarina</strong>, as pesquisas parecem indicar a importância <strong>de</strong> uma investigação mais focalizada do caráter e das<br />

formas que assumem suas relações sociais. Assim, nas mais variadas áreas <strong>de</strong> conhecimento, a partir <strong>de</strong> temas e<br />

lugares diversos e mesmo entre perspectivas teóricas divergentes, as pesquisas locais apontam recorrentemente<br />

para: o peso estrutural das relações <strong>de</strong> parentesco na organização da “produção material da vida social” (BECK,<br />

1984; LAGO, 1983, 1996; GIMENO, 1992; ANDERMANN, 1996; CÓRDOVA, 1986; ALBANO AMORA,<br />

1996); a existência <strong>de</strong> formas variadas <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong> e aliança nas “relações <strong>de</strong> vizinhança” (CARTANA,<br />

1989; LUPI, 1993; FLORES E SILVA, 1991; LACERDA, 1994, AVELAR, 1993); uma forte presença do<br />

“clientelismo político” e da “compadragem” (ALBUQUERQUE, 1983; WERNER, 1985; GIMENO, 1992;<br />

CARTANA, 1989; AVELLAR, 1993); a incidência <strong>de</strong> “casamentos consangüíneos” e da chamada “endogamia<br />

<strong>de</strong> lugar” (FARIAS, 1980; GIMENO, 1992; AVELLAR, 1993); a ambigüida<strong>de</strong> da posição da mulher, ora<br />

aparecendo como indivíduo subordinado a um sistema “patriarcal” e “patrilocal” (BECK, 1983; GIMENO,<br />

1992), ora com uma posição “matrifocal” nas relações domésticas e investida <strong>de</strong> po<strong>de</strong>res mágicos (FLORES E<br />

SILVA, 1991; MALUF, 1993, LACERDA, 1994); a incidência <strong>de</strong> formas jocosas <strong>de</strong> sociabilida<strong>de</strong> e a<br />

recorrência <strong>de</strong> “insultos verbais”, mais evi<strong>de</strong>ntes nas práticas <strong>de</strong> conversação entre os homens (LACERDA,<br />

1994; TELLES, 2002); e, por fim, a intensida<strong>de</strong> dos modos <strong>de</strong> afirmação étnica em contraste a outros grupos<br />

como alemães e italianos ou gaúchos e argentinos (RAMOS FLORES, 1997; KAISER,1999; SCHEIMEL, 1994;<br />

ALEXANDRE, 1999; FANTIN, 2000; KUHNEN, 2001).<br />

Entre as tendências apontadas, <strong>de</strong>staca-se a importância do “parentesco ilhéu” como campo específico<br />

<strong>de</strong> estudo a ser explorado. Isso porque as pesquisas realizadas apontam na direção do peso estrutural das relações<br />

<strong>de</strong> parentesco relativamente às conexões com os outros planos da vida social local , isto é, o econômico, o<br />

político, o cosmológico etc. Isto sugere uma investigação do sistema <strong>de</strong> parentesco como um todo. Entretanto<br />

esta é mais uma hipótese <strong>de</strong> trabalho do que uma conclusão, porque não há, até o momento, uma etnografia<br />

<strong>de</strong>stas populações que tenha se <strong>de</strong>bruçado exclusivamente sobre este campo. Existem dados esparsos, com<br />

ênfases diversas como as referidas acima, todas apontando para a importância do campo. Em outras palavras,<br />

<strong>de</strong>sconheço um estudo etnográfico mais <strong>de</strong>talhado que tenha englobado os domínios clássicos do parentesco, ou<br />

seja, filiação, residência, aliança, termos <strong>de</strong> tratamento/<strong>de</strong>signação e o sistema <strong>de</strong> atitu<strong>de</strong>s. Este é um projeto que

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