30.10.2014 Views

O Atlântico Açoriano - Musa - Universidade Federal de Santa Catarina

O Atlântico Açoriano - Musa - Universidade Federal de Santa Catarina

O Atlântico Açoriano - Musa - Universidade Federal de Santa Catarina

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

157<br />

Com a recente valorização da “cultura açoriana”, na base <strong>de</strong> um processo <strong>de</strong><br />

apropriação das tradições do passado (v. capitulo 2), inúmeros eventos <strong>de</strong>ste calendário<br />

tradicional vêm ressurgindo em novas bases e com novos apelos. Her<strong>de</strong>iros <strong>de</strong> um passado<br />

étnica e culturalmente diversificado, os açoriano-<strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes re-valorizaram sua i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> e<br />

tradições,<br />

através <strong>de</strong> suas organizações e movimentos locais. Do ponto <strong>de</strong> vista históricocultural,<br />

sabemos que este repertório <strong>de</strong> tradições não provem unicamente da bagagem cultural<br />

dos antepassados açorianos, mas reúne contribuições <strong>de</strong> várias etnias formadoras do povo<br />

brasileiro. Mas sabemos também que estas são lutas simbólicas que se encerram na habilida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> grupos e ativistas culturais para fazerem progredir suas <strong>de</strong>mandas por reconhecimento e<br />

visibilida<strong>de</strong> na esfera publica. Neste sentido, é preciso indagar qual o papel das “tradições”<br />

na organização social e política da cultura. Concordo com Linnekin (1983:241) que, ancorada<br />

no caso havaiano, propõe uma visão da tradição como “um mo<strong>de</strong>lo consciente <strong>de</strong> modos <strong>de</strong><br />

vida passados que as pessoas usam na construção <strong>de</strong> sua i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>”. Trata-se <strong>de</strong> um mo<strong>de</strong>lo<br />

que molda a experiência individual e <strong>de</strong> grupo e é moldada por elas. A tradição conteria um<br />

ingrediente básico, qual seja, uma herança cultural partilhada, no entanto, a seleção do que a<br />

constitui é sempre feita no presente, o conteúdo do passado sendo re<strong>de</strong>finido pela significação<br />

mo<strong>de</strong>rna. Assim, a tradição é fluida, o conteúdo é <strong>de</strong>finido a cada geração e sua<br />

intemporalida<strong>de</strong> po<strong>de</strong> ser situacionalmente construída. Nesta visão, qualquer busca por uma<br />

história que toma o autentico pelo real é irrelevante. Em outras palavras, se nos <strong>de</strong>ixarmos<br />

levar facilmente por aquilo que Grunewald (1999: 38) chamou <strong>de</strong> “ilusão autóctone”, isto é, a<br />

idéia <strong>de</strong> que os grupos étnicos “guardam uma cultura aborígine”, per<strong>de</strong>mos <strong>de</strong> vista o caráter<br />

estratégico e situacional pertinente à análise das formas <strong>de</strong> etnicida<strong>de</strong>, on<strong>de</strong> as tradições<br />

aparecem como diacríticos em constante negociação a <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r da situação histórica.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!