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O Atlântico Açoriano - Musa - Universidade Federal de Santa Catarina

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tripulação. Neste universo <strong>de</strong> relações, a retórica da igualda<strong>de</strong> seria um elemento nivelador <strong>de</strong><br />

diferenças, conferindo soli<strong>de</strong>z às prestações requeridas. E, na ausência <strong>de</strong> obrigações<br />

contratuais entre os camaradas, a hierarquia, por sua vez, faz relativizar o individualismo,<br />

enquanto ética que presi<strong>de</strong> a igualda<strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rna <strong>de</strong> direitos e oportunida<strong>de</strong>s.<br />

Voltei ao Pântano do Sul várias vezes, mas, <strong>de</strong>finitivamente, o mar naquele ano não<br />

estava para tainhas. Resumindo o que foi <strong>de</strong>scrito acima: A “socieda<strong>de</strong> dos camaradas” reúne<br />

180 pessoas, que usufruem da distribuição do pescado capturado por sete canoas, que têm<br />

seus donos. A lista é antiga, sendo seus membros permanentes (só entra um novo quando<br />

alguém morre). Nela estão incluídas as viúvas que ficam no lugar dos maridos mortos . Seja<br />

qual for a canoa que capturar o peixe, tudo é distribuído entre os 180, através da cota <strong>de</strong> dois<br />

terços para os camaradas e um terço para o dono, diferentemente das outras comunida<strong>de</strong>s em<br />

que normalmente é meio a meio. Sendo uma comunida<strong>de</strong> ocupacional, a socieda<strong>de</strong> dos<br />

camaradas baseia-se na hierarquia <strong>de</strong> funções e posições, tanto no processo <strong>de</strong> captura quanto<br />

na distribuição do peixe, entre vigias, remeiros, donos <strong>de</strong> re<strong>de</strong>s, patrões <strong>de</strong> canoas, ajudantes,<br />

viúvas e, também visitantes ou <strong>de</strong>sconhecidos que ganham peixe pela ajuda no puxar da re<strong>de</strong>.<br />

*<br />

As etnografias sobre socieda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> trabalho em comunida<strong>de</strong>s pesqueiras,<br />

especialmente as que organizam as chamadas pescarias artesanais <strong>de</strong> arrasto <strong>de</strong> cardumes<br />

migratórios (tainha, anchova etc), oferecem <strong>de</strong>scrições <strong>de</strong>talhadas do processo ritual e das<br />

relações <strong>de</strong> sociabilida<strong>de</strong> que as envolvem. Tais estudos chegam a sugerir um campo ou<br />

subdisciplina da Antropologia Marítima ou Antropologia das Socieda<strong>de</strong>s Haliêuticas, em que,<br />

dadas as complexida<strong>de</strong>s e especificida<strong>de</strong>s do mundo marítimo, conceitos e métodos <strong>de</strong>

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