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O Atlântico Açoriano - Musa - Universidade Federal de Santa Catarina

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-religioso e espaço privilegiado <strong>de</strong> execução das promessas; e a pesca artesanal da tainha,<br />

ligada ao mundo do trabalho, da hierarquia e da camaradagem. Portanto, em uma perspectiva<br />

histórico-cultural, sem maior rigor, diria que, on<strong>de</strong> houver uma localida<strong>de</strong> litorânea em <strong>Santa</strong><br />

<strong>Catarina</strong> cuja população seja, em sua maioria, <strong>de</strong> ascendência açoriano-brasileira, esses três<br />

eventos rituais estarão presentes e combinados em suas mais variadas formas. Diria, enfim,<br />

nesta mesma perspectiva que o “Boi”, o “Divino” e a “Tainha” po<strong>de</strong>riam ser tomados como<br />

síntese da cosmologia ilhôa, isto é, como cifras da visão <strong>de</strong> mundo do ilhéu, uma visão<br />

informada por realismos mágicos on<strong>de</strong> pontuam crenças em seres fantásticos que se<br />

metamorfoseiam, bruxas, lobisomens, borboletas, maus-olhados e bem-querências.<br />

Visando contribuir para uma antropologia da sociabilida<strong>de</strong>, gostaria <strong>de</strong> apontar<br />

alguns caminhos <strong>de</strong> análise a partir da <strong>de</strong>scrição oferecida neste capítulo relativa às formas<br />

locais <strong>de</strong> interação social. Vou classificá-las amplamente como compreen<strong>de</strong>ndo aquelas<br />

formas ligadas (A) ao domínio das relações jocosas e (B) ao domínio do dom.<br />

(A) Relações jocosas, relaciones burlescas, joking relationships, parenté à<br />

plaisainteries constituem tema fundamental na Antropologia <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que Radcliffe-Brown o<br />

consagrou num artigo publicado em 1940 30 . Naquela época, o autor i<strong>de</strong>ntificou a jocosida<strong>de</strong><br />

como “uma relação entre duas pessoas na qual uma é, por costume lícito e, em alguns casos,<br />

obrigatório, levada a importunar ou a zombar <strong>de</strong> outra que, por sua vez, não po<strong>de</strong> ficar<br />

aborrecida” (RADCLIFFE-BROWN, 1940, p. 115). O parentesco por brinca<strong>de</strong>ira seria uma<br />

combinação especial <strong>de</strong> antagonismo e amistosida<strong>de</strong>, e o autor ligou esse tipo <strong>de</strong> relação às<br />

relações <strong>de</strong> evitação, procurando localizar o tipo <strong>de</strong> situação estrutural na qual se po<strong>de</strong> esperar<br />

encontrá-la, tipicamente aquelas geradas pelo casamento ou por duas tribos ou clãs distintos<br />

em que o parentesco por brinca<strong>de</strong>ira funcionava como “modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> organização <strong>de</strong> um<br />

30 O artigo e uma nota adicional estão em Radcliffe-Brown (1973[1952]). Vale dizer que o tema foi tratado antes<br />

por Marcel Mauss em artigo publicado em 1928 (apud RADCLIFFE-BROWN, op. cit., p. 115) no Annuaire <strong>de</strong><br />

l’Ecole Pratique <strong>de</strong>s Hautes Etu<strong>de</strong>s, Section <strong>de</strong>s Sciences Religieuses.

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