O Atlântico Açoriano - Musa - Universidade Federal de Santa Catarina
O Atlântico Açoriano - Musa - Universidade Federal de Santa Catarina
O Atlântico Açoriano - Musa - Universidade Federal de Santa Catarina
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
194<br />
era <strong>de</strong>vido, mas, no alarido da festa, havia uma clima <strong>de</strong> farra e insultos verbais <strong>de</strong> toda<br />
espécie. Esta jocosida<strong>de</strong> é um gênero ambíguo <strong>de</strong> interação, porque os insultos, são uma<br />
“malda<strong>de</strong> sem malda<strong>de</strong>”, como disse Inocêncio, numa conversa comigo no Pântano do Sul:<br />
E – Uma coisa que me impressiona é ver que o pessoal parece que brinca <strong>de</strong> brigar, parece<br />
que tá ofen<strong>de</strong>ndo! Inocêncio: – Ah, isso é <strong>de</strong> malda<strong>de</strong>, mas não tem malda<strong>de</strong>!. Você tem que<br />
ser esperto, porque tá errado mesmo, mas tem que aceitar, porque é assim.<br />
O imperador chega <strong>de</strong> forma pomposa. Dentro da Igreja, o padre, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> esperar<br />
pacientemente a cantoria do terno, abriu a missa pedindo que o povo “esquecesse um pouco<br />
as luzes, cores e velas da festa, esquecesse a imaginação, para ficar no essencial, que é a fé na<br />
Santíssima Trinda<strong>de</strong>”. Mas lá fora corria o alarido da quermesse...<br />
A Festa – Na missa da coroação do casal imperial, a passagem das duas ban<strong>de</strong>iras<br />
para o toque e beijação pelo povo é um momento <strong>de</strong> comoção. As pessoas relembram os<br />
milagres, agra<strong>de</strong>cem e pe<strong>de</strong>m ao Santo, há distribuição <strong>de</strong> pãezinhos abençoados e, por fim, a<br />
pequena comilança <strong>de</strong> cuca, café e quentão, oferecidos pelos casal no salão paroquial. Não<br />
<strong>de</strong>vo esquecer dos fogos <strong>de</strong> artifício. Eles explo<strong>de</strong>m o tempo todo. São estouros, luzes ou<br />
saraivadas e variam <strong>de</strong> acordo com o momento da festa: anunciar a chegada do cortejo<br />
imperial, iluminar o céu, abrir estandartes.<br />
Nesse último dia, a celebração foi dirigida pelo Pe. Ernesto a convite da organização.<br />
Lembrou, na homilia, a sauda<strong>de</strong> e o que apren<strong>de</strong>u com as comunida<strong>de</strong>s do Sul da Ilha. No<br />
sermão, afirmou que a origem da <strong>de</strong>voção ao Divino <strong>de</strong>ve-se aos antepassados açorianos que,<br />
ao se verem num tempo <strong>de</strong> incertezas quando aqui chegados, “uniram-se na fé, para superar as<br />
dificulda<strong>de</strong>s, agarrados à ban<strong>de</strong>ira do Divino, tal como nos Açores”. Lembrou que o Divino<br />
não é apenas “cultura” mas, “<strong>de</strong>voção”, que “a <strong>de</strong>voção é da or<strong>de</strong>m da vivência, não um<br />
objeto <strong>de</strong> estudo”. Note-se aqui a associação da noção <strong>de</strong> cultura a um empreendimento<br />
racionalizador. O padre faz uma distinção estratégica para lembrar aos fiéis que a fé no