30.10.2014 Views

O Atlântico Açoriano - Musa - Universidade Federal de Santa Catarina

O Atlântico Açoriano - Musa - Universidade Federal de Santa Catarina

O Atlântico Açoriano - Musa - Universidade Federal de Santa Catarina

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

119<br />

fundadora, a noção <strong>de</strong> “sangue”, a idéia <strong>de</strong> “alma” ou “essência” da cultura, a tradição como<br />

evocação, a nostalgia cultural, a cultura do folclore e da musealização do passado, a<br />

i<strong>de</strong>ntificação com lealda<strong>de</strong>s primordiais, a retórica da autenticida<strong>de</strong> e da pureza. No caso<br />

açoriano em <strong>Santa</strong> <strong>Catarina</strong>, a idéia <strong>de</strong> cultura sofre uma tradução seja nos termos da<br />

i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>, no sentido <strong>de</strong> que ter i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> é ter uma cultura herdada; seja nos termos <strong>de</strong><br />

tradição, no sentido <strong>de</strong> um conjunto <strong>de</strong> manifestações recolhidas da memória coletiva que vai<br />

legitimar o reclamo da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> cultural do presente e do passado. A base do movimento<br />

cultural açorianista é justificada pela idéia <strong>de</strong> resgatar a cultura, como sinônimo <strong>de</strong> orgulho e<br />

valorização das tradições locais. Ora, sabemos que não se po<strong>de</strong> resgatar algo que já se per<strong>de</strong>u<br />

em sua forma original. Isto reflete, uma visão essencializada da historia e da cultura, vista<br />

como um complexo <strong>de</strong> tradições sobreviventes do passado (daí o termo tão difundido <strong>de</strong><br />

“resgate”). A crítica <strong>de</strong> Fantin (2000: 169) sobre a visão essencialista <strong>de</strong> cultura do<br />

movimento açorianista parece-me correta. O problema é que <strong>de</strong>sconheço, em todos esses<br />

casos, um outro modo <strong>de</strong> concepção e práticas <strong>de</strong> convencimento que sejam tão eficazes, já<br />

que a busca das raízes, a construção <strong>de</strong> referenciais i<strong>de</strong>ntitários, as epopéias <strong>de</strong> origem, a<br />

valorização da auto-estima e a idéia <strong>de</strong> pertencimento legitimo à uma terra-mãe, não<br />

po<strong>de</strong>riam realizar-se nem política, nem emocionalmente, sem valer-se à larga, <strong>de</strong> noções<br />

essencialistas e culturalizadas.<br />

Tudo isso provoca a sensação <strong>de</strong> um paradoxo. Como diz Oliveira (op. cit: 31), a<br />

propósito das novas i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s dos índios do Nor<strong>de</strong>ste brasileiro: “Enquanto o percurso dos<br />

antropólogos foi o <strong>de</strong> <strong>de</strong>smistificar a noção <strong>de</strong> ´raça´ e <strong>de</strong>sconstruir a <strong>de</strong> ´etnia´, os membros<br />

<strong>de</strong> um grupo étnico, encaminham-se freqüentemente na direção contrária, reafirmando a sua<br />

unida<strong>de</strong> e situando as conexões com a origem em planos que não po<strong>de</strong>m ser atravessados ou<br />

arbitrados pelos <strong>de</strong> fora.” Esta é a mesma crítica feita por Sahlins (1997:136), a propósito<br />

daqueles que têm sugerido a falência do conceito <strong>de</strong> cultura, enquanto, em todo o planeta,

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!