O Atlântico Açoriano - Musa - Universidade Federal de Santa Catarina
O Atlântico Açoriano - Musa - Universidade Federal de Santa Catarina
O Atlântico Açoriano - Musa - Universidade Federal de Santa Catarina
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
200<br />
A política do favor explicita-se claramente nas épocas eleitorais, quando o ilhéu é<br />
tomado por uma posição ambígua entre a tradicional fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong> ao político local e o<br />
pragmatismo que <strong>de</strong>corre da valorização do voto:<br />
Altamiro – Na minha época, era política firme. Quem era <strong>de</strong> um partido, era firme como se<br />
fosse assim... vacinado. Não podia passar pro outro. Mas tinha uma coisa: quando o governo<br />
era do PSD, a direção da banda passava pro PSD, que é pra pegar apoio, auxílio do governo,<br />
pra ter liberda<strong>de</strong> com o governo. Quando passava o governo pra UDN, automaticamente a<br />
diretoria passava a ser da UDN pra ter acesso nos políticos aí. E era sempre, <strong>de</strong> um ou <strong>de</strong><br />
outro, ela [a banda] tinha uma ajudazinha... (...) Mas hoje em dia tá pior. Hoje o político é o<br />
que se ven<strong>de</strong>. Com mais facilida<strong>de</strong> ainda. São eleitos por um partido. Daqui a pouco, ganham<br />
um presente, já se filiam pro outro e fim <strong>de</strong> papo. Até mais que o eleitor. O eleitor não tá<br />
ligando mais pra política, sabe? Ele vai porque é obrigado a votar, mas não tá nem aí, sabe?<br />
Ele já tá enten<strong>de</strong>ndo que essa coisa <strong>de</strong> ser fiel é... essa coisa é bobagem.<br />
A relação com os antigos chefes políticos <strong>de</strong>monstra uma prevalência da confiança em<br />
função <strong>de</strong> uma “dívida <strong>de</strong> obrigação”:<br />
Altamiro – Então ele [o chefe político] tinha uma lista gran<strong>de</strong> <strong>de</strong> gente pra empregar. Eu até<br />
an<strong>de</strong>i com ele por aí, dirigindo um Jipe, <strong>de</strong> casa em casa. Ele conversava, conversava. Então o<br />
cara dava um esporro [bronca] nele e ele com aquela calma né. Esperto, sabe? Era assim até<br />
que ele arrumava emprego. Aí a turma toda votava nele, e assim ele sempre ganhava eleição<br />
aqui. E naquela época o pessoal era mais honesto. Se pegava um emprego, eles votavam<br />
mesmo. Era fiel.<br />
Marilena – Ele [o chefe político] era tão comentado, tão criticado, mas era uma pessoa tão<br />
boa, tão amigo, ajudava as pessoas. Ele arrumava a vida <strong>de</strong> todo mundo. Ele tinha uma<br />
facilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> contato, ele era muito fiel, era cabo-eleitoral.<br />
Embora a relação com os atuais chefes políticos tenha sofrido modulações ao longo do<br />
tempo e os nativos afirmem que já não mais existe a antiga “fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong>”, o relato abaixo<br />
indica que a ambigüida<strong>de</strong> entre a confiança e o pragmatismo não parece ter mudado,<br />
revelando a permanência e o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> um estilo <strong>de</strong> relacionamento comum aos velhos chefes<br />
políticos, isto é, a ajuda silenciosa e a intimida<strong>de</strong> com o po<strong>de</strong>r:<br />
E – A senhora acha que o atual chefe político faz o mesmo trabalho do que o antigo?