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O Atlântico Açoriano - Musa - Universidade Federal de Santa Catarina

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137<br />

ciclos das estações. Este relato <strong>de</strong> Humberto, mostra como se articulam estas confluências<br />

histórico-culturais:<br />

Humberto - O calendário açoriano começa a partir <strong>de</strong> um período <strong>de</strong> produção que se inicia em<br />

novembro, quando a agricultura, pelo calor, <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser uma forma <strong>de</strong> produção. A não ser o<br />

milho que é produzido <strong>de</strong> três em três meses, a mandioca nesse período tá germinando, o<br />

homem açoriano passa a ter um calendário que começa com as festas <strong>de</strong> natal, todas aquelas<br />

cantorias e o próprio Pão por Deus que tá vindo <strong>de</strong> outubro, porque o Pão por Deus é o<br />

primeiro sinal do ciclo. O Pão por Deus começa a ser distribuído quando o aipê floresce . É o<br />

sinal <strong>de</strong> termino do inverno e início do verão. Mas em seguida ao Pão por Deus, o Finados é<br />

um período que para o açoriano não é um período <strong>de</strong> festas, é um período realmente<br />

extremamente sentido, porque o açoriano concentrou o choro aos mortos em novembro. Passou<br />

novembro não se chora mais morto. Novembro é o período pra chorar morto, ir no cemitério,<br />

rezar, chorar, contar as fofocas, rever parentes. Passou esse ciclo o morto fica no seu lugar e a<br />

família segue. Aí tem o ciclo <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro que emenda até março, aon<strong>de</strong> você vai ter o ciclo<br />

das festas natalinas, seguidas das festas <strong>de</strong> reis junto com os folguedos: é a época do boi <strong>de</strong><br />

mamão, a brinca<strong>de</strong>ira do mascarado, os ternos <strong>de</strong> Reis, <strong>de</strong> Natal, <strong>de</strong> São Sebastião, <strong>de</strong> Santo<br />

Amaro. Vão entrar as danças <strong>de</strong> rodas, porque são períodos em que as pessoas ficam até mais<br />

tar<strong>de</strong> acordadas. Quando chega a Quaresma, há então um paralisar. Vem as procissões do<br />

Senhor dos Passos. Só há um re<strong>de</strong>spertar no sábado <strong>de</strong> Aleluia, com a farra do boi. Então,<br />

<strong>de</strong>pois disso, <strong>de</strong>ssa Quaresma, com a Páscoa, o Aleluia, vem na seqüência, o ciclo do Divino,<br />

que termina com o cerimonial maior da procissão <strong>de</strong> Corpus Christi, encerrando o<br />

Pentecostes. Então <strong>de</strong>pois <strong>de</strong>sse período pra frente, morria tudo. As pessoas iam para os<br />

engenhos, para a agricultura até outubro quando começava o ciclo <strong>de</strong> novo.<br />

Note então que estas festas e ritos estão marcadas, em primeiro lugar, pelas celebrações<br />

litúrgicas consagradas pela Igreja Católica Romana: Advento, Natal, Epifania <strong>de</strong> Reis,<br />

Quaresma, Páscoa e Pentecostes. Em segundo lugar, estes eventos sinalizam inúmeras práticas<br />

<strong>de</strong>vocionais oriundas do catolicismo popular <strong>de</strong> origem luso-brasileira. São práticas<br />

<strong>de</strong>vocionais sincréticas, como as folias, rezas, procissões, novenas, romarias, festas <strong>de</strong> santos<br />

padroeiros e ritos <strong>de</strong> pagamento <strong>de</strong> promessas (SERPA, 1997). Em terceiro lugar, estas festas<br />

e ritos estão associadas, <strong>de</strong> um lado, às mudanças estacionais e, <strong>de</strong> outro, aos ciclos do<br />

trabalho como colheitas, safras e socieda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> trabalho temporário. As mudanças <strong>de</strong> estação,<br />

12 Muitas outras cruzes estão fincadas pela Ilha e são objeto <strong>de</strong> um projeto <strong>de</strong> recuperação pelo Museu <strong>de</strong><br />

Antropologia da UFSC. Estas informações foram gentilmente cedidas pelo Diretor do Museu, Gelcy Coelho,

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