O Atlântico Açoriano - Musa - Universidade Federal de Santa Catarina
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Na mesma direção em que a abordagem da expressão oral apreen<strong>de</strong> a “narrativa como<br />
o resultado do evento da sua própria narração num contexto cultural particular” (LANGDON,<br />
1999, p. 15), ou então que a obra <strong>de</strong> arte apresenta “reflexões que não são meramente<br />
contructos lógicos, mas dizem respeito à experiência estética, à afetivida<strong>de</strong> e a códigos<br />
culturais” (BIZERRIL, 1999, p. 106), assim também a abordagem do ritual não <strong>de</strong>ve ater-se a<br />
uma sua interpretação meramente alegórica, finalizando a “verda<strong>de</strong>” <strong>de</strong> seu significado<br />
expressivo em uma instância que lhe é oculta e exterior. A questão que discuto aqui é a da<br />
necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> atenção a uma chave <strong>de</strong> interpretação dos sistemas expressivos que possa<br />
captá-los em sua capacida<strong>de</strong> própria <strong>de</strong> produzir sentido. Assim sendo, tais sistemas não<br />
seriam uma representação da verda<strong>de</strong>, mas um discurso da vida que provocaria, no evento<br />
ritual, uma reflexão dos participantes sobre si mesmos ou uma inflexão em sua experiência<br />
social. Neste caso, o rito, assim como outras formas expressivas (uma obra <strong>de</strong> arte, uma peça<br />
teatral, uma missa ou qualquer ativida<strong>de</strong> humana ritualmente significativa), seria um campo<br />
privilegiado a uma interpretação estética dos fatos humanos.<br />
Atualmente, o esforço <strong>de</strong> metaforizar o ritual como discurso ou linguagem tem-se<br />
consubstanciado na noção <strong>de</strong> performance. Conforme Langdon (1999, p. 21),<br />
O conceito <strong>de</strong> performance surgiu <strong>de</strong> dois paradigmas da antropologia atual: a vida<br />
social como dramaturgia, ou como drama social (GEERTZ, 1983) e a ‘performance<br />
como evento’, que tem seu enfoque nas características e na produção dos eventos<br />
performáticos. A primeira surgiu do campo da antropologia simbólica e seus estudos<br />
sobre a relação entre rito, socieda<strong>de</strong> e transformação, <strong>de</strong>senvolvidos por Victor<br />
Turner, Clifford Geertz e outros. A segunda evoluiu <strong>de</strong>ntro do campo da etnografia<br />
da fala, que é marcada pelo cruzamento <strong>de</strong> interesses <strong>de</strong> lingüistas, folcloristas,<br />
antropólogos, filósofos, sociólogos etc (BAUMAN, 1976, 1977).<br />
A idéia <strong>de</strong> performance é particularmente importante na análise atual da dinâmica dos<br />
rituais, porque valoriza, em primeiro lugar, a experiência multisensorial como enfoque básico<br />
sentido. O impasse entre alegorismo e tautegorismo é uma questão extremamente complexa e remonta a<br />
Aristóteles. Em sua Poética (1973, IX, 451), o filósofo, ao contrário <strong>de</strong> Dante, <strong>de</strong>fine como ofício <strong>de</strong> poeta narrar<br />
não o que aconteceu – função esta do historiador – mas o que po<strong>de</strong>ria acontecer, “segundo a verossimilhança e a