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98<br />

É uma coisa muito simples. O brigada era o velho sargento, com 15, 20 anos <strong>de</strong> vida<br />

<strong>de</strong> quartel, que recebia o posto <strong>de</strong> brigada. Porque não havia o subtenente. Ele era<br />

acima dos sargentos e abaixo dos oficiais. Ele era um homem que tinha uma espada<br />

especial. Não era a espada <strong>de</strong> copo, era a espada como é a do Caxias, meio-copo.<br />

Essa era a espada do brigada. O brigada era o homem que rendia as paradas diárias:<br />

chega a velha guarda, ele faz uma continência ao terreno, apresentar armas...<br />

"Continência ao terreno, apresentar armas." Cumprimenta-se o solo da pátria. Isso é<br />

coisa que a gente apren<strong>de</strong> <strong>de</strong>s<strong>de</strong> tenente: continência ao terreno. Quando a gente sai<br />

em formatura e não sai com ban<strong>de</strong>ira, na saída e na chegada faz continência ao<br />

terreno. Se está <strong>de</strong> ban<strong>de</strong>ira faz continência à ban<strong>de</strong>ira (…) Havia os tenentes<br />

comissionados... Isso aí é uma evolução em que tomei parte também, porque havia<br />

necessida<strong>de</strong>, havia falta <strong>de</strong> tenente e criaram o subtenente e aumentaram a carreira<br />

do sargento. O sargento era limitado, o brigada não ia adiante. E havia rapazes <strong>de</strong><br />

gran<strong>de</strong> valor, que podiam ser mais aproveitados, mas o brigada ficava naquela<br />

posição. (…) O brigada era responsável, tinha uma ascendência sobre os sargentos...<br />

Ele era o dono da casa, da or<strong>de</strong>m on<strong>de</strong> se fazia o boletim, ele era o dono do boletim.<br />

Era ele que fiscalizava o datilógrafo. Depois vou contar sobre o brigada Pereira, que<br />

era formidável. O brigada Pereira era muito pernóstico. Ele ditava o boletim para o<br />

datilógrafo: "Arraçoamento: sejam arraçoados para amanhã, nos seus lados tais e<br />

tais..." Daqui a pouco saía uma palavra meio complicada, ele virava e dizia assim:<br />

"Sabe escrever essa palavra, maquinista" [Risos] (…) Se é uma máquina <strong>de</strong><br />

escrever! Então é maquinista. Então o datilógrafo: "Sim senhor!" Se ele errasse, era<br />

preso, porque disse que sabia e não soube... O brigada Pereira prendia. Assim era o<br />

brigada Pereira. O brigada tinha uma ascendência imensa sobre os sargentos. E eram<br />

homens com vinte, trinta anos <strong>de</strong> vida no quartel fazendo escrituração. São os<br />

homens que escreviam isto que está aqui, olha. Isto que está aqui é letra do brigada<br />

Pereira. Olha a perfeição. 164<br />

Ele era um sargento alçado a um posto <strong>de</strong> “quase-oficial”. Um “quase-oficial que se<br />

sentia como um pleno. Era um sargento com amplos po<strong>de</strong>res <strong>de</strong> pren<strong>de</strong>r um soldado, por<br />

causa <strong>de</strong> um erro <strong>de</strong> grafia. Era o ápice para a vida militar <strong>de</strong> um sargento. Seu contato<br />

funcional com os oficiais do Estado-Maior da unida<strong>de</strong>, bem possivelmente o fazia se sentir<br />

um <strong>de</strong>les. Numa mesma unida<strong>de</strong>, e talvez numa mesma seção, durante muito tempo <strong>de</strong> sua<br />

vida, chegando cedo, saindo tar<strong>de</strong>, possivelmente tenha feito com que o sargento se sentisse<br />

um pouco dono da seção e um pouco dono da unida<strong>de</strong>. É uma ascendência por respeito à<br />

experiência. E uma ascendência que, me parece, conquistada pela <strong>de</strong>voção e truculência<br />

extremas, aliadas a um espírito autocrático que é bem comum <strong>de</strong> ser cultivado no Exército.<br />

Por isso, nos dizeres do velho general, o “brigada Pereira prendia” (MURICY, 1981, pp. 60-<br />

61), o que era bem possível, apesar <strong>de</strong> não haver previsões regulamentares <strong>de</strong> sargentos<br />

mandarem soldados presos.<br />

De fato, o sargento podia interce<strong>de</strong>r ao comando que assim o fizesse, e o grau <strong>de</strong><br />

164 MURICY, Antônio Carlos da Silva. Antônio Carlos Murici I (<strong>de</strong>poimento, 1981). Rio <strong>de</strong> Janeiro, CPDOC,<br />

1993. 768 p. Dat., pp. 60-61. Disponível em: http://www.fgv.br/cpdoc/historal/arq/Entrevista35.pdf; Acesso<br />

em: 15 Dez 2011.

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