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O padrão <strong>de</strong> tratamento apenas reforçava a associação feita entre a condição <strong>de</strong><br />

escravo e <strong>de</strong> soldado. O recrutamento militar e a composição social dos soldados explicavam<br />

em parte essa associação recorrente entre escravidão e serviço militar. Segundo Kraay,<br />

44<br />

Embora nenhuma proporção exata possa ser estabelecida, a maioria dos soldados<br />

brasileiros eram forçados a entrar no serviço militar através do sistema judicial,<br />

como punição por pequenos (ou até gran<strong>de</strong>s) crimes, por vadiagem, ou por violação<br />

<strong>de</strong> padrões morais. Grupos <strong>de</strong> recrutamento escolhiam outros tipos <strong>de</strong> indivíduos<br />

durante campanhas periódicas. A maioria dos estudiosos chegou à conclusão <strong>de</strong> que<br />

o serviço militar recaía sobre os mais pobres dos pobres livres, principalmente os<br />

jovens <strong>de</strong> cor. Os pobres livres, no entanto, formavam uma categoria social com a<br />

qual a classe escrava se misturava, às vezes imperceptivelmente. Escravos que<br />

trabalhavam por conta própria, passando apenas uma porção dos seus ganhos para<br />

seus donos; escravos que circulavam nas ruas a serviço <strong>de</strong> seus senhores; escravos<br />

condicionalmente alforriados, lutando para saldar a dívida pela sua liberda<strong>de</strong> ou<br />

cumprindo as condições testamentárias <strong>de</strong> acompanhar e servir a her<strong>de</strong>iros <strong>de</strong> seus<br />

senhores; e os escravos fugidos que buscavam refazer suas vidas; todos eram<br />

indistinguíveis daquela população (KRAAY, 1996, pp. 38-39).<br />

Nesse diapasão, o sadismo do mando, característica da socieda<strong>de</strong> civil nacional, por<br />

consequência da escravidão e do mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> relações sociais por ela regido, tornou-se uma<br />

realida<strong>de</strong> no âmbito do Exército, que parecia sobrelevar-se, ao arrepio da própria<br />

normatização dos castigos. De acordo com Mc Cann,<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente do prescrito no regulamento, as punições ficavam ao sabor <strong>de</strong><br />

caprichos. Um oficial aposentado que serviu nas fileiras <strong>de</strong> alistados no inicio do<br />

século observou que a 'dosagem das penas disciplinares' geralmente <strong>de</strong>pendia do<br />

'humor transitório dos chefes', os quais nem sempre se norteavam pelo critério <strong>de</strong><br />

corrigir ou ensinar. Confundiam o '<strong>de</strong>ver <strong>de</strong> punir' com o 'direito <strong>de</strong> castigar'<br />

(MCCANN, 2009, p. 112).<br />

Enquanto os oficiais bacharéis eram formados com diletantismo intelectual, mas com<br />

pouca ou nenhuma ativida<strong>de</strong> puramente militar, e com a disciplina tão frouxa quanto as<br />

faculda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Direito ou Medicina, na formação das praças eram corriqueiros os castigos<br />

físicos dos mais variados, aplicados, também, por aqueles mesmos oficiais bacharéis.<br />

Uma tradição europeia da socialização militar das praças previa um elemento base e<br />

praticamente naturalizado na formação do bom soldado, cumpridor <strong>de</strong> or<strong>de</strong>ns. Para<br />

acostumarem-se à rusticida<strong>de</strong> da vida em campanha e às agruras da guerra, as praças<br />

<strong>de</strong>veriam ser submetidas às mais abjetas condições. Qualquer tipo <strong>de</strong> conforto, até mesmo o<br />

temor que se infun<strong>de</strong> é alimentado pelo receio <strong>de</strong> castigo, que é um sentimento que não se abandona nunca”<br />

(MAQUIAVEL, 1996, p. 98).

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