Download tese - Setor de Ciências Humanas UFPR - Universidade ...
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econheceriam o autor como um igual, facilitando a abordagem e as entrevistas 10<br />
propriamente ditas. De fato, na maioria das vezes, assim aconteceu. 11 Isso ocorreu talvez<br />
porque, ainda que haja uma hierarquização horizontal entre o círculo <strong>de</strong> sargentos – que,<br />
algumas vezes, chega a ser tão ou mais intransponível, tão ou mais sedimentada e sólida<br />
quanto a hierarquização vertical, tanto para cima quanto para baixo –, há um reconhecimento<br />
mínimo <strong>de</strong> semelhanças i<strong>de</strong>ntitárias <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>ssa relação, que não <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> também ser<br />
hierárquica.<br />
O fato <strong>de</strong> fazer parte do grupo a ser estudado, não só facilitaria minha primeira<br />
aproximação em relação aos entrevistados, como também me facilitaria o entendimento do<br />
que diriam, uma vez que os entrevistados eram minhas fontes em construção. Estar imerso em<br />
seu próprio objeto <strong>de</strong> pesquisa, apesar das fragilida<strong>de</strong>s já citadas, possivelmente ajudaria a<br />
tornar mais claros <strong>de</strong>terminados fluxos da dinâmica relacional do objeto <strong>de</strong> estudo, que<br />
po<strong>de</strong>riam ser consi<strong>de</strong>rados obscuros, para um não iniciado, ou mal interpretados. Tornam-se,<br />
talvez, mais perceptíveis as suas menores e quase invisíveis nuances, principalmente nos<br />
aspectos i<strong>de</strong>ntitários e socialmente relacionais e, portanto, os que nos interessam.<br />
Estar envolto em um turbilhão <strong>de</strong> eventos, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que se busque uma relativa<br />
alienação <strong>de</strong>sses eventos, po<strong>de</strong> significar uma observação mais atenta <strong>de</strong> cada <strong>de</strong>talhe dos<br />
elementos <strong>de</strong> sua configuração e a <strong>de</strong>terminação <strong>de</strong> padrões, que dificilmente seriam fitados<br />
por um observador externo ou, ainda, um observador completamente tomado emocionalmente<br />
pelo evento. 12<br />
13<br />
10<br />
11<br />
12<br />
O que também traz problemas, principalmente na hora das entrevistas, porque os entrevistados, às vezes,<br />
<strong>de</strong>ixam <strong>de</strong>liberadamente <strong>de</strong> enfatizar <strong>de</strong>terminados assuntos que são <strong>de</strong> suma relevância por acharem ser já<br />
do conhecimento do entrevistador. Ao percebê-lo, é sempre interessante o entrevistador adotar um<br />
posicionamento semelhante ao do “não iniciado” e fazer perguntas que, ainda que soem falsas e formais no<br />
momento da entrevista, tentem esclarecer a omissão.<br />
Deixo registrado o enorme pesar com que os convites para entrevistas, com três antigos sargentos, foram<br />
recusados, todos eles com o mesmo e forte argumento. Foram gentis, mas peremptórios na recusa, alegando<br />
que seu tempo <strong>de</strong> caserna fora tão ruim que sequer gostariam <strong>de</strong> se lembrar que foram militares um dia. Seria<br />
sobremodo interessante captar seus pontos <strong>de</strong> vista, para tentar compreen<strong>de</strong>r as motivações que levaram<br />
esses três sargentos a terem esse tipo <strong>de</strong> sentimento, em relação a uma instituição que fizeram parte por<br />
praticamente trinta anos <strong>de</strong> suas vidas. Nas suas palavras, percebe-se uma amargura, quase beirando à<br />
repulsa, que talvez possa ser explicada indiretamente por meio das entrevistas aqui analisadas. É digno <strong>de</strong><br />
nota o fato <strong>de</strong> que os três ex-sargentos sondados, sem tomarem conhecimento um do outro, utilizaram-se <strong>de</strong><br />
argumentos muito próximos, quase utilizando-se das mesmas palavras. O sentido <strong>de</strong> não gostar <strong>de</strong> se lembrar<br />
que foram militares um dia talvez já faça parte <strong>de</strong> um senso comum ligado àqueles para os quais a função<br />
social que exerceram no Exército tenha sido sentida <strong>de</strong> uma maneira negativa.<br />
Norbert Elias, fazendo uma análise do conto <strong>de</strong> Edgard Allan Poe, A <strong>de</strong>scida do Maelström, conclui que um<br />
indivíduo teria conseguido escapar <strong>de</strong> um re<strong>de</strong>moinho, por ter visualizado padrões <strong>de</strong>ntro dos quais os<br />
objetos cilíndricos e menores eram tragados mais lentamente do que objetos <strong>de</strong> outra forma e maiores. O<br />
personagem teria se salvado somente porque tivera a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> manter a cabeça fria num momento