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numa relação <strong>de</strong> mando, que aparentemente unívoca, estabelecia a passivida<strong>de</strong> e a<br />

inferiorida<strong>de</strong> plena dos subordinados diante da ativida<strong>de</strong> e superiorida<strong>de</strong> integral dos<br />

superiores. Passivida<strong>de</strong> e inferiorida<strong>de</strong> que possuem algumas facetas apresentadas pelo<br />

discurso do <strong>de</strong>poente. A primeira <strong>de</strong>las é a <strong>de</strong>sumanização dos soldados nas suas figuras <strong>de</strong><br />

linguagem: o capitão que “tratava os soldados que nem cachorro”. Outra é a representação do<br />

domínio fálico, através da espada do tenente, que, num <strong>de</strong>terminado dia, penetrou nas carnes<br />

<strong>de</strong> um soldado. Outra, ainda, é a própria conjunção carnal, com a quebra do tabu homossexual<br />

entre oficiais e praças, numa história contada pelo <strong>de</strong>poente já no final <strong>de</strong> sua entrevista:<br />

267<br />

Os dois eram <strong>de</strong> Santa Maria. O capitão era solteiro. E o sargento era casado (...)<br />

Eles eram amigos e tal. E aí, a mulher do sargento saiu pra fazer alguma coisa. Aí<br />

voltou e pegou os dois no... (Entrevista 5).<br />

Des<strong>de</strong> a <strong>de</strong>sumanização até a sodomização, passando pelo trato brutal, essas três são<br />

apenas facetas das potencialida<strong>de</strong>s sádicas que po<strong>de</strong>m se <strong>de</strong>senvolver com esse mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong><br />

mando, e nos tabus que ele estabelece, quase sempre baseados na ativida<strong>de</strong> e superiorida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

uns, e passivida<strong>de</strong> e inferiorida<strong>de</strong> <strong>de</strong> outros.<br />

Parece, porém, que essa relativa liberda<strong>de</strong> para externar o mando sádico tinha limites<br />

muito bem estabelecidos. Esses limites eram traçados pelo peso da moeda <strong>de</strong> troca que cada<br />

um podia oferecer em cada uma <strong>de</strong> suas funções. Esse era um fato nada exclusivo do<br />

Exército. Levi Bucalem Ferrari, a partir do estudo <strong>de</strong> Michel Crozier, sobre o fenômeno<br />

burocrático, conclui que<br />

Nas organizações mais burocráticas é possível encontrar-se com maior frequência o<br />

caso <strong>de</strong> funcionários <strong>de</strong> escalões inferiores que, ocupando uma posição estratégica,<br />

<strong>de</strong>sempenham um papel <strong>de</strong>cisivo na solução <strong>de</strong> assuntos importantes. Isto acarretalhes<br />

privilégios exorbitantes on<strong>de</strong> a regra seria a igualda<strong>de</strong> (FERRARI, 2006, p.<br />

120).<br />

Em relação ao Exército Brasileiro, mesmo a arraia miúda, representada por<br />

<strong>de</strong>terminadas funções exercidas pelos soldados, era alçada a posições muito próximas do<br />

po<strong>de</strong>r <strong>de</strong>cisório <strong>de</strong> um quartel, fato que, por si só, faziam-nos soldados privilegiados em<br />

relação aos <strong>de</strong>mais. O <strong>de</strong>poente testemunha que “tinha aqueles diferentes. Às vezes tu é o<br />

cassineiro, o Ajudante <strong>de</strong> Or<strong>de</strong>ns, então o tratamento era diferente” (Entrevista 5). Foi o caso<br />

do <strong>de</strong>poente que, não somente fora testemunha ocular, mas vivera uma vida <strong>de</strong> um soldado<br />

“diferente”. Logo no final <strong>de</strong> seu ano <strong>de</strong> serviço militar obrigatório, o <strong>de</strong>poente fora escolhido

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