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zen e a arte da manutenção de motocicletas

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as categorias não são permutáveis. Pertenço ao segundo grupo, e<br />

talvez seja por isso que eu gosto muito mais <strong>de</strong> consertar <strong>de</strong>feitos<br />

do que <strong>de</strong> fazer limpeza. Entretanto, posso fazer as duas coisas<br />

quando é necessário, assim como todo mundo. Enquanto eu limpo<br />

a moto, ajo <strong>da</strong> mesma maneira que as pessoas que vão à igreja ─<br />

não procuro <strong>de</strong>scobrir na<strong>da</strong> <strong>de</strong> novo, embora esteja atento às novi<strong>da</strong><strong>de</strong>s,<br />

mas sim refamiliarizar-me com o que já me é familiar. As<br />

vezes, é agradável percorrer vere<strong>da</strong>s conheci<strong>da</strong>s.<br />

O Zen tem algumas idéias interessantes sobre o tédio. A sua<br />

prática principal, a <strong>de</strong> “ficar apenas sentado”, <strong>de</strong>ve ser a ativi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

mais tediosa do mundo ─ com exceção <strong>da</strong> prática hindu <strong>de</strong> enterrar-se<br />

vivo. A gente não faz mais na<strong>da</strong>; não se mexe, não pensa,<br />

nem se preocupa. Existe coisa mais maçante? Porém, no cerne <strong>de</strong><br />

todo esse tédio está exatamente aquilo que o Zen-budismo procura<br />

ensinar. E o que é? O que haverá no próprio âmago do tédio, que<br />

não estamos enxergando?<br />

A impaciência parece-se com o tédio, mas sempre provém <strong>de</strong><br />

uma causa: uma <strong>de</strong>preciação do tempo que o trabalho vai durar.<br />

Você nunca sabe o que po<strong>de</strong> aparecer, e muito poucos são os serviços<br />

feitos <strong>de</strong>ntro do prazo estabelecido. A impaciência é a primeira<br />

reação contra os contratempos, e po<strong>de</strong> logo transformar-se em raiva,<br />

se você não se cui<strong>da</strong>r.<br />

A impaciência se cura evitando-se criar cronogramas <strong>de</strong>finidos<br />

para a realização do trabalho, principalmente para trabalhos<br />

novos, que envolvem técnicas <strong>de</strong>sconheci<strong>da</strong>s. Também se po<strong>de</strong> dobrar<br />

o tempo, estabelecido quando as circunstâncias requerem um<br />

certo cronograma; ou então, po<strong>de</strong>-se reduzir proporcionalmente o<br />

âmbito <strong>de</strong> serviço. Os objetivos gerais <strong>de</strong>vem ser postos em segundo<br />

plano, e os objetivos imediatos, em primeiro. Isto exige uma<br />

flexibili<strong>da</strong><strong>de</strong> moral, e a mu<strong>da</strong>nça <strong>de</strong> valores é geralmente acompanha<strong>da</strong><br />

por uma certa per<strong>da</strong> <strong>de</strong> brio. Mas é um sacrifício que precisa<br />

ser feito. Não é na<strong>da</strong>, comparado à per<strong>da</strong> <strong>de</strong> brio que ocorrerá se<br />

acontecer um Gran<strong>de</strong> Erro por causa <strong>da</strong> impaciência.<br />

Meu exercício preferido <strong>de</strong> redução proporcional é a limpeza<br />

<strong>de</strong> porcas, parafusos, pinos e roscas internas. Tenho ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira<br />

aversão a roscas espana<strong>da</strong>s, gastas, cheias <strong>de</strong> ferrugem ou <strong>de</strong> sujeira,<br />

que fazem as porcas girarem <strong>de</strong>vagar ou com dificul<strong>da</strong><strong>de</strong>; e<br />

quando encontro uma rosca assim, meço suas dimensões com um<br />

calibrador e com os paquímetros, apanho as tarraxas, recupero a<br />

rosca, <strong>de</strong>pois a examino, lubrifico e aí fico com uma perspectiva inteiramente<br />

nova sobre a paciência. Outro bom exercício é limpar as<br />

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