19.04.2013 Views

zen e a arte da manutenção de motocicletas

zen e a arte da manutenção de motocicletas

zen e a arte da manutenção de motocicletas

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

O professor <strong>de</strong> filosofia <strong>de</strong>finira a dialética, e Fedro tinha ouvido<br />

com to<strong>da</strong> a atenção, só que a <strong>de</strong>finição entrou por um ouvido<br />

e saiu pelo outro, característica típica dos enunciados filosóficos<br />

que omitem alguma coisa. Numa outra aula outro aluno, que aparentemente<br />

tinha o mesmo tipo <strong>de</strong> problema, pediu que o professor<br />

repetisse a <strong>de</strong>finição, e <strong>de</strong>ssa vez o professor olhou para Fedro, com<br />

outro lampejo <strong>de</strong> medo, e ficou bastante nervoso. Fedro começou<br />

a imaginar se a “dialética” não teria algum significado especial que<br />

a transformasse numa palavra-fulcro ─ aquela que po<strong>de</strong> <strong>de</strong>sequilibrar<br />

uma análise, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ndo do lugar on<strong>de</strong> é coloca<strong>da</strong>. E acontece<br />

que ela era mesmo uma palavra assim.<br />

Dialética significa, via <strong>de</strong> regra, “<strong>da</strong> natureza do diálogo”, que<br />

é uma conversação entre duas pessoas. Hoje em dia, isso significa<br />

argumentação lógica; consiste numa técnica <strong>de</strong> avaliação mútua,<br />

através <strong>da</strong> qual se chega à ver<strong>da</strong><strong>de</strong>. É a espécie <strong>de</strong> discurso utiliza<strong>da</strong><br />

por Sócrates, nos Diálogos <strong>de</strong> Platão. Platão acreditava que a<br />

dialética era o único método pelo qual se po<strong>de</strong>ria conhecer a ver<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

O único.<br />

Eis por que a dialética era uma palavra-fulcro. Aristóteles<br />

criticou essa idéia, di<strong>zen</strong>do que a dialética só servia a alguns fins ─<br />

investigar as idéias humanas, chegar às ver<strong>da</strong><strong>de</strong>s sobre as formas<br />

eternas <strong>da</strong>s coisas, as chama<strong>da</strong>s Idéias, que eram fixas e imutáveis<br />

e constituíam a reali<strong>da</strong><strong>de</strong> platônica. Aristóteles dizia que existia<br />

também o método científico, ou físico, que pela observação dos fatos<br />

físicos chega às ver<strong>da</strong><strong>de</strong>s sobre substâncias que são mutáveis.<br />

A duali<strong>da</strong><strong>de</strong> forma-substância e o método científico <strong>de</strong> conhecer os<br />

fatos acerca <strong>da</strong>s substâncias eram vitais na filosofia aristotélica.<br />

Daí a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> que Aristóteles tinha <strong>de</strong> negar à dialética a importância<br />

que lhe atribuíam Platão e Sócrates. Por isso, a “dialética”<br />

era e continua sendo uma palavra-fulcro.<br />

Fedro acreditava que aquela história <strong>de</strong> Aristóteles rebaixar<br />

a dialética <strong>de</strong> único método platônico para alcançar a ver<strong>da</strong><strong>de</strong> para<br />

um simples “complemento <strong>da</strong> retórica” <strong>de</strong>via revoltar tanto os mo<strong>de</strong>rnos<br />

platônicos quanto teria revoltado o próprio Platão. Como o<br />

professor <strong>de</strong> filosofia não sabia a que “corrente” Fedro estava filiado,<br />

ficava nervoso. Talvez tivesse medo que Fedro, o platônico, fosse<br />

atacá-lo. Mas nesse caso, certamente na<strong>da</strong> teria a temer. Fedro<br />

não se ofen<strong>de</strong>u ao ver que a dialética tinha sido iguala<strong>da</strong> à retórica.<br />

Ao contrário, revoltou-se ao ver que a retórica fora rebaixa<strong>da</strong> ao<br />

nível <strong>da</strong> dialética. Foi essa a confusão que se estabeleceu.<br />

Naturalmente, só Platão po<strong>de</strong>ria esclarecer tudo isso, e, feliz-<br />

364

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!