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zen e a arte da manutenção de motocicletas

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mas sabe que se não se manifestar terá <strong>de</strong> assinar um outro tipo<br />

<strong>de</strong> con<strong>de</strong>nação.<br />

O presi<strong>de</strong>nte vê a mão, surpreso, e fica perturbado, mas permite<br />

que Fedro fale. E ele <strong>de</strong>clara:<br />

─ Tudo isso não passa <strong>de</strong> uma analogia.<br />

Silêncio profundo. O presi<strong>de</strong>nte parece confuso.<br />

─ O quê? ─ pergunta. Quebrou-se o encanto <strong>da</strong> representação.<br />

─ To<strong>da</strong> essa <strong>de</strong>scrição do carro e dos cavalos não passa <strong>de</strong><br />

uma analogia.<br />

─ O quê?! ─ repete ele; e <strong>de</strong>pois, levantando a voz: ─ É a ver<strong>da</strong><strong>de</strong>!<br />

Sócrates jurou aos <strong>de</strong>uses que é a ver<strong>da</strong><strong>de</strong>!<br />

─ Mas o próprio Sócrates diz que é uma analogia ─ replica<br />

Fedro.<br />

─ Se você ler o diálogo, <strong>de</strong>scobrirá que Sócrates afirma especificamente<br />

que é a Ver<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

─ Sim, mas antes disso... creio que dois parágrafos... ele afirma<br />

que é uma analogia.<br />

O texto está sobre a mesa, para ser consultado, mas o presi<strong>de</strong>nte<br />

tem a prudência <strong>de</strong> não fazê-lo, porque se o fizer e estiver<br />

errado, sua reputação perante a classe vai por água abaixo. Foi ele<br />

mesmo quem disse que ninguém leu o texto direito.<br />

Retórica, 1; Dialética, 0.<br />

É fantástico ter-se lembrado disso, pensa Fedro. Simplesmente<br />

arrasa to<strong>da</strong> a posição dialética. Talvez seja este o xis <strong>da</strong><br />

questão. É claro que é uma analogia. Tudo é uma analogia. Só que<br />

os dialéticos não sabem disso. Eis por que o presi<strong>de</strong>nte omitiu a<br />

<strong>de</strong>claração <strong>de</strong> Sócrates. Fedro a havia captado e evocado porque, se<br />

Sócrates não a houvesse feito, não estaria di<strong>zen</strong>do a “Ver<strong>da</strong><strong>de</strong>”.<br />

Ninguém percebeu ain<strong>da</strong>, mas não tar<strong>da</strong>rão a notar que o<br />

Presi<strong>de</strong>nte <strong>da</strong> banca <strong>de</strong> Análise <strong>de</strong> Idéias e Estudo <strong>de</strong> Métodos acabou<br />

<strong>de</strong> ser alvejado em plena sala <strong>de</strong> aula.<br />

Ele per<strong>de</strong>u a fala. Não consegue nem encontrar o quer dizer.<br />

O silêncio que favoreceu o enaltecimento <strong>da</strong> sua imagem no início<br />

<strong>da</strong> aula, agora o está <strong>de</strong>struindo. Ele não enten<strong>de</strong> <strong>de</strong> on<strong>de</strong> veio o<br />

tiro. Nunca teve <strong>de</strong> enfrentar um sofista em carne e osso. Apenas<br />

sofistas mortos.<br />

Agora, está tentando agarrar-se a alguma coisa, mas não encontra<br />

na<strong>da</strong>. Seu próprio impulso o empurrou para a beira <strong>de</strong> um<br />

abismo, e quando finalmente acha palavras, transforma-se em outro<br />

tipo <strong>de</strong> pessoa: num colegial que esqueceu a lição, fez o <strong>de</strong>ver<br />

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