19.04.2013 Views

zen e a arte da manutenção de motocicletas

zen e a arte da manutenção de motocicletas

zen e a arte da manutenção de motocicletas

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

ninguém se arrisca a apresentar uma opinião pessoal na sala.<br />

─ É-é-é-é ─ respon<strong>de</strong> o professor.<br />

Fedro, calado, tenta encontrar uma resposta. Todos estão esperando.<br />

Os pensamentos <strong>de</strong>le correm à veloci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> luz, joeirando<br />

as opções dialéticas, experimentando uma joga<strong>da</strong> <strong>de</strong> abertura<br />

após outra, naquele jogo <strong>de</strong> xadrez dialético, percebendo que todos<br />

falham, procurando outras alternativas, ca<strong>da</strong> vez mais rápido ─<br />

mas tudo o que a turma observa é o seu silêncio. Afinal, meio sem<br />

jeito, o professor <strong>de</strong>siste <strong>da</strong> pergunta e começa a aula.<br />

Fedro, porém, não presta atenção. Sua cabeça está a mil por<br />

hora, percorrendo as combinações dialéticas, uma após outra, <strong>de</strong>scobrindo<br />

coisas, novos ramos e sub-ramos, explodindo <strong>de</strong> raiva a<br />

ca<strong>da</strong> <strong>de</strong>scoberta que constata a corrupção, a sordi<strong>de</strong>z e a baixeza<br />

<strong>da</strong>quela “<strong>arte</strong>” chama<strong>da</strong> dialética. O professor, notando a expressão<br />

<strong>de</strong> Fedro, fica bastante assustado, e continua a aula com uma<br />

espécie <strong>de</strong> pavor. Os pensamentos <strong>de</strong> Fedro prosseguem, avançando<br />

ca<strong>da</strong> vez mais, e constatando, afinal, a presença <strong>de</strong> uma coisa<br />

maligna, um mal profun<strong>da</strong>mente arraigado <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>le mesmo,<br />

que fingia tentar compreen<strong>de</strong>r o amor, a beleza, a ver<strong>da</strong><strong>de</strong> e a sabedoria,<br />

mas que tinha como objetivo real jamais compreendê-los,<br />

que visava apenas usurpar-lhes o lugar e sentar-se ela mesma no<br />

trono. Era a dialética ─ a usurpadora. Foi isso que ele compreen<strong>de</strong>u.<br />

Um parvenu, acotovelando tudo que diz respeito ao Bem e<br />

procurando contê-lo e controlá-lo. O Mal. O professor termina a<br />

aula mais cedo e abandona a sala às pressas.<br />

Depois que os alunos saem, em silêncio, um por um, Fedro<br />

fica sozinho à enorme mesa redon<strong>da</strong>, até o sol <strong>de</strong>saparecer, <strong>de</strong>ixando<br />

<strong>de</strong> iluminar o ar poluído que se vê pela janela, tornando a sala<br />

primeiro cin<strong>zen</strong>ta, <strong>de</strong>pois escura.<br />

No dia seguinte ele espera a biblioteca abrir e <strong>de</strong>pois começa<br />

a estu<strong>da</strong>r furiosamente tudo o que havia antes <strong>de</strong> Platão, pela<br />

primeira vez. Lê o pouco que se conhece dos retóricos, que Platão<br />

tanto <strong>de</strong>sprezava. E o que <strong>de</strong>scobre começa a confirmar o que já<br />

intuíra a partir dos pensamentos que teve na noite anterior.<br />

Muitos estudiosos já encararam com bastante reserva a con<strong>de</strong>nação<br />

platônica em relação aos sofistas. O próprio presi<strong>de</strong>nte <strong>da</strong><br />

banca insinua que os críticos que não têm certeza <strong>da</strong>s intenções<br />

<strong>de</strong> Platão também não po<strong>de</strong>riam ter certeza <strong>da</strong>s intenções dos interlocutores<br />

<strong>de</strong> Sócrates nos diálogos. Uma vez que Platão colocou<br />

suas palavras na boca <strong>de</strong> Sócrates (segundo Aristóteles), não havia<br />

razão para duvi<strong>da</strong>r que ele também po<strong>de</strong>ria ter colocado suas pa-<br />

368

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!