19.04.2013 Views

zen e a arte da manutenção de motocicletas

zen e a arte da manutenção de motocicletas

zen e a arte da manutenção de motocicletas

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

óxido que impe<strong>de</strong> um maior grau <strong>de</strong> oxi<strong>da</strong>ção, o que também vem<br />

a calhar.<br />

Em outras palavras, qualquer mecânico alemão que se preze,<br />

com meio século <strong>de</strong> quali<strong>da</strong><strong>de</strong> nas costas, concluiria que essa solução<br />

era perfeita para aquele caso específico.<br />

Por um instante pensei que eu <strong>de</strong>veria era ter disfarçado, ido<br />

até a banca<strong>da</strong>, tirado um calço <strong>da</strong> lata <strong>de</strong> cerveja, apagado a tinta<br />

e voltado, di<strong>zen</strong>do ao John que estávamos com sorte, aquele era o<br />

último que eu tinha, vindo diretamente <strong>da</strong> Alemanha. Aposto que<br />

teria funcionado. Um calço especial do estoque particular do barão<br />

Alfred Krupp, adquirido à custa <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> sacrifício. Aí o John teria<br />

ficado completamente abestalhado com o calço.<br />

Aquela idéia do calço particular do barão Krupp me satisfez<br />

por um tempo, mas <strong>de</strong>pois se esvaiu, pois eu percebi que era só<br />

uma fantasia tola em busca <strong>de</strong> vingança. Cresceu em seu lugar<br />

o velho sentimento <strong>de</strong> que já falei, uma sensação <strong>de</strong> que há algo<br />

maior por trás disso tudo. Às vezes, investigando pequenas incoerências,<br />

chega-se a gran<strong>de</strong>s <strong>de</strong>scobertas. Eu sentia que o problema<br />

era muito complexo para que eu o abor<strong>da</strong>sse sem mais aquela,<br />

mas, em vez <strong>de</strong> esquecer, resolvi, como <strong>de</strong> costume, investigar as<br />

causas e os efeitos para ver quais os fatores que po<strong>de</strong>riam levar a<br />

um impasse entre a visão <strong>de</strong> John sobre aquele calço e a minha.<br />

Isso acontece to<strong>da</strong> hora, quando se trabalha com mecânica. Um<br />

impasse. A gente senta e fica <strong>de</strong> olhar parado, pensando, procurando<br />

aleatoriamente novas informações, vai embora, volta, e <strong>de</strong>pois<br />

<strong>de</strong> algum tempo os fatores não <strong>de</strong>tectados começam a surgir.<br />

Primeiro, o que surgiu <strong>de</strong> uma forma ain<strong>da</strong> in<strong>de</strong>fini<strong>da</strong>, e <strong>de</strong>pois<br />

mais níti<strong>da</strong>, foi a explicação <strong>de</strong> que eu tinha encarado aquele<br />

calço <strong>de</strong> maneira intelectual, racional, na qual o que importava<br />

eram as características físicas e químicas do metal. John o encarou<br />

<strong>de</strong> um modo imediato e intuitivo, bem emocional. Eu avaliei a<br />

lata em termos <strong>de</strong> forma subjacente. Ele, em termos <strong>de</strong> aparência<br />

superficial. Eu via o que o calço significava. Ele, o que o calço era.<br />

Eis como cheguei a essa distinção. E quando a gente vê o calço só<br />

como ele é, a coisa fica mesmo <strong>de</strong>primente. Quem é que gostaria<br />

<strong>de</strong> ver uma lin<strong>da</strong> máquina <strong>de</strong> precisão conserta<strong>da</strong> com um pe<strong>da</strong>ço<br />

<strong>de</strong> lata velha?<br />

Acho que me esqueci <strong>de</strong> mencionar que o John é músico, um<br />

baterista, toca em conjuntos <strong>da</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong> inteira e ganha um bom dinheiro<br />

com isso. Acho que ele encara tudo <strong>da</strong> mesma forma que a<br />

bateria ─ ou seja, ele nem pensa sobre as coisas. Ele só faz. E isso<br />

59

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!