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Cartas do CárCere - Estaleiro Editora

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27 de junho de 1932<br />

(Carta 113)<br />

Queridíssima Iulca,<br />

recebim os teus folhetos, data<strong>do</strong>s em messes e dias diferentes.<br />

as tuas cartas lembrárom-me um conto de um escritor<br />

francês pouco conheci<strong>do</strong>, Lucien Jean, acho, que era um pequeno<br />

funcionário numha administraçom municipal de Paris.<br />

o conto intitulava-se Un uomo in un fosso 169 . tento lembrarme<br />

dele. Um homem bebera muito umha noite: talvez bebera<br />

demasia<strong>do</strong>, se calhar a visom continuada de lindas mulheres<br />

o alucinara um pouco. depois de sair <strong>do</strong> local de encontro,<br />

depois de ter caminha<strong>do</strong> um pouco em zigue-zague polo caminho,<br />

caiu num fosso. estava mui obscuro, o corpo ficou-lhe<br />

preso entre pedras e silvas; estava um pouco assusta<strong>do</strong> e nom<br />

se moveu, por me<strong>do</strong> a cair ainda mais para o fun<strong>do</strong>. as silvas<br />

recompugérom-se sobre ele, as lesmas passavam-lhe por cima<br />

esbranquiçan<strong>do</strong>-o (até um sapo se lhe pousou sobre o coraçom,<br />

sentin<strong>do</strong> o bati<strong>do</strong>; na realidade, porque o considerava<br />

ainda vivo). Passárom as horas; chegou a manhá e as primeiras<br />

luzes <strong>do</strong> abrente, começou a passar gente. o homem pujo-se a<br />

pedir ajuda. achegou-se um senhor de óculos; era um cientista<br />

que tornava a casa, depois de ter trabalha<strong>do</strong> no seu laboratório<br />

experimental. Que tem o senhor? perguntou. — Queria<br />

sair <strong>do</strong> fosso, respondeu o homem. — ah, ah! Querias sair <strong>do</strong><br />

fosso! e que sabes tu da vontade, <strong>do</strong> livre arbítrio, <strong>do</strong> servo<br />

arbítrio! Querias, querias! sempre a idêntica ignoráncia. sabes<br />

apenas umha cousa: que estavas de pé por causa das leis da<br />

169 o conto de Lucien Jean (pseudónimo de Lucien dieu<strong>do</strong>nné), 1870-1908,<br />

fora publicada por G. no semanário L’Ordine Nuovo, 6-13 de dezembro de 1919.<br />

Lucien Jean pertence à chamada «escola proletária» da literatura francesa.<br />

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