12.05.2013 Views

Cartas do CárCere - Estaleiro Editora

Cartas do CárCere - Estaleiro Editora

Cartas do CárCere - Estaleiro Editora

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

estática, e que caíche por causa das leis da cinemática. Que ignoráncia,<br />

que ignoráncia! — e afastou-se abanan<strong>do</strong> a cabeça,<br />

to<strong>do</strong> indigna<strong>do</strong>. — sentírom-se outros passos. Novas invocaçons<br />

<strong>do</strong> homem. achegou-se um labrego, que levava da trela<br />

um porco para a feira, e fumava o cachimbo: ai, ai. Caíche no<br />

fosso, eh? Bebeche avon<strong>do</strong>, passache-lo bem e caíche no fosso.<br />

e por quê nom foche <strong>do</strong>rmir, como figem eu? — e afastou-se,<br />

com o passo compassa<strong>do</strong> polo cuinhar <strong>do</strong> porco. e mais tarde<br />

passou um artista, que se lamentava porque o homem queria<br />

sair <strong>do</strong> fosso: estava tam lin<strong>do</strong>, to<strong>do</strong> esbranquiça<strong>do</strong> polas<br />

lesmas, com umha auréola de ervas e flores silvestres baixo a<br />

cabeça, era tam patético! e passou um ministro de deus, que<br />

se puxo a imprecar contra a depravaçom da cidade que se divertia<br />

ou <strong>do</strong>rmia quan<strong>do</strong> um irmao caíra no fosso. exaltou-se<br />

e saiu às carreiras para fazer um terrível sermom na próxima<br />

missa. desta maneira, o homem permaneceu no fosso até que<br />

nom enxergou ao seu re<strong>do</strong>r, viu com exatitude onde caíra,<br />

torceu-se, curvou-se, fijo palanca com os braços e com as pernas,<br />

pujo-se em pé, e saiu <strong>do</strong> fosso com as suas únicas forças.<br />

Nom sei se gostache <strong>do</strong> conto nem se é mui ajeita<strong>do</strong>. Mas<br />

polo menos em parte penso que sim: tu mesma escreves que<br />

nom lhe dás a razom a nengum <strong>do</strong>s <strong>do</strong>us médicos que consultache<br />

recentemente, e que se até agora deixavas decidir aos<br />

outros, agora queres ser mais forte. Nem sequer considero<br />

que haja um pouco de desespero nestes sentimentos: penso<br />

que som bem sensatos. É preciso queimar to<strong>do</strong> o passa<strong>do</strong> e<br />

reconstruir toda umha vida nova: nom é preciso deixar-se<br />

esmagar pola vida vivida até agora, ou polo menos é preciso<br />

conservar dela apenas aquilo que foi construtivo e mesmo bonito.<br />

É preciso sair <strong>do</strong> fosso e deitar fora o sapo <strong>do</strong> coraçom.<br />

Cara Iulca, abraço-te com tenrura.<br />

antonio<br />

354

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!