08.04.2017 Views

Manual de Direito Civil - Flávio Tartuce - 7ª Ed. - 2017 [materialcursoseconcursos.blogspot.com.br]

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

<strong>Manual</strong> <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>Civil</strong><<strong>br</strong> />

inadimplemento relativo. O conceito <strong>de</strong> mora po<strong>de</strong> também ser retirado da leitura do art. 394 do CC,<<strong>br</strong> />

cujo teor é: “consi<strong>de</strong>ra­se em mora o <strong>de</strong>vedor que não efetuar o pagamento e o credor que não o quiser<<strong>br</strong> />

recebê­lo no tempo, lugar e forma que a lei ou a convenção estabelecer”. Assim, repise­se que mora não<<strong>br</strong> />

é apenas um inadimplemento temporal, po<strong>de</strong>ndo estar relacionada <strong>com</strong> o lugar ou a forma <strong>de</strong><<strong>br</strong> />

cumprimento. A<strong>de</strong>mais, pelo que consta <strong>de</strong>sse <strong>com</strong>ando legal, percebe­se que há duas espécies <strong>de</strong> mora.<<strong>br</strong> />

Primeiro, há a mora do <strong>de</strong>vedor, <strong>de</strong>nominada mora solvendi, <strong>de</strong>bitoris ou <strong>de</strong>bendi. Esse<<strong>br</strong> />

inadimplemento estará presente nas situações em que o <strong>de</strong>vedor não cumpre, por culpa sua, a prestação<<strong>br</strong> />

referente à o<strong>br</strong>igação, <strong>de</strong> acordo <strong>com</strong> o que foi pactuado. Prevê o art. 396 do CC que não havendo fato<<strong>br</strong> />

ou omissão imputado ao <strong>de</strong>vedor, não incorre este em mora. Assim, a doutrina tradicional sempre<<strong>br</strong> />

apontou que a culpa genérica (incluindo o dolo e a culpa estrita) é fator necessário para a sua<<strong>br</strong> />

caracterização. 49<<strong>br</strong> />

Entretanto, existem outras vozes na doutrina contemporânea <strong>de</strong>duzindo que a culpa não é fator<<strong>br</strong> />

necessário e indispensável para a caracterização da mora do <strong>de</strong>vedor. Dentro <strong>de</strong>ssa corrente está Judith<<strong>br</strong> />

Martins­Costa, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>ndo que muitas vezes a culpa não estará presente, o que não prejudica a<<strong>br</strong> />

caracterização do atraso. Cita, por exemplo, os casos envolvendo uma o<strong>br</strong>igação <strong>de</strong> resultado assumida,<<strong>br</strong> />

situações em que a análise da culpa é dispensada. 50 A jurista tem razão, eis que nos casos <strong>de</strong><<strong>br</strong> />

responsabilida<strong>de</strong> objetiva ou sem culpa da parte o<strong>br</strong>igacional, a mora também prescin<strong>de</strong> da prova <strong>de</strong> tal<<strong>br</strong> />

elemento subjetivo. Ilustre­se, em reforço, a responsabilida<strong>de</strong> objetiva do transportador.<<strong>br</strong> />

O principal efeito da mora do <strong>de</strong>vedor é a responsabilização do sujeito passivo da o<strong>br</strong>igação por<<strong>br</strong> />

todos os prejuízos causados ao credor, mais juros, atualização monetária – segundo índices oficiais – e<<strong>br</strong> />

honorários do advogado, no caso <strong>de</strong> propositura <strong>de</strong> uma ação específica (art. 395, caput, do CC).<<strong>br</strong> />

Em <strong>com</strong>plemento, se em <strong>de</strong>corrência da mora a prestação tornar­se inútil ao credor, este po<strong>de</strong>rá<<strong>br</strong> />

rejeitá­la, cabendo a resolução da o<strong>br</strong>igação <strong>com</strong> a correspon<strong>de</strong>nte reparação por perdas e danos. No<<strong>br</strong> />

último caso, a mora é convertida em inadimplemento absoluto (parágrafo único do art. 395 do CC). Em<<strong>br</strong> />

relação a tal <strong>com</strong>ando, foi aprovado, na III Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>Civil</strong>, o Enunciado n. 162, <strong>com</strong> o<<strong>br</strong> />

seguinte teor: “A inutilida<strong>de</strong> da prestação que autoriza a recusa da prestação por parte do credor <strong>de</strong>ve ser<<strong>br</strong> />

aferida objetivamente, consoante o princípio da boa­fé e a manutenção do sinalagma, e não <strong>de</strong> acordo<<strong>br</strong> />

<strong>com</strong> o mero interesse subjetivo do credor”.<<strong>br</strong> />

Dessa forma, é preciso analisar a utilida<strong>de</strong> da o<strong>br</strong>igação à luz da função social das o<strong>br</strong>igações e dos<<strong>br</strong> />

contratos, da boa­fé objetiva, da manutenção da base estrutural do negócio jurídico, <strong>de</strong> modo a evitar a<<strong>br</strong> />

onerosida<strong>de</strong> excessiva e o enriquecimento sem causa. Também se <strong>de</strong>ve buscar ao máximo preservar a<<strong>br</strong> />

autonomia privada, o que é aplicação do princípio da conservação dos negócios jurídicos. Dentro <strong>de</strong>ssa<<strong>br</strong> />

i<strong>de</strong>ia, po<strong>de</strong> ser mencionada a teoria do adimplemento substancial. Conforme o Enunciado n. 361,<<strong>br</strong> />

aprovado na IV Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>Civil</strong>: “O adimplemento substancial <strong>de</strong>corre dos princípios gerais<<strong>br</strong> />

contratuais, <strong>de</strong> modo a fazer prepon<strong>de</strong>rar a função social do contrato e o princípio da boa­fé objetiva,<<strong>br</strong> />

balizando a aplicação do art. 475”. São autores do enunciado os juristas Jones Figueirêdo Alves e<<strong>br</strong> />

<strong>Ed</strong>uardo Bussatta, que têm trabalhos <strong>de</strong> referência so<strong>br</strong>e o assunto. 51<<strong>br</strong> />

Pela teoria do adimplemento substancial (substantial performance), em hipóteses em que a<<strong>br</strong> />

o<strong>br</strong>igação tiver sido quase toda cumprida, não caberá a extinção do contrato, mas apenas outros efeitos<<strong>br</strong> />

jurídicos, visando sempre à manutenção da avença. A jurisprudência superior tem aplicado a teoria em<<strong>br</strong> />

casos <strong>de</strong> mora <strong>de</strong> pouca relevância em contratos <strong>de</strong> financiamento:<<strong>br</strong> />

“Arrendamento mercantil. Reintegração <strong>de</strong> posse. Adimplemento substancial. Trata­se <strong>de</strong><<strong>br</strong> />

REsp oriundo <strong>de</strong> ação <strong>de</strong> reintegração <strong>de</strong> posse ajuizada pela ora recorrente em <strong>de</strong>sfavor do<<strong>br</strong> />

recorrido por inadimplemento <strong>de</strong> contrato <strong>de</strong> arrendamento mercantil (leasing) para a aquisição<<strong>br</strong> />

<strong>de</strong> 135 carretas. A Turma reiterou, entre outras questões, que, diante do substancial<<strong>br</strong> />

adimplemento do contrato, qual seja, foram pagas 30 das 36 prestações da avença, mostra­se<<strong>br</strong> />

<strong>de</strong>sproporcional a pretendida reintegração <strong>de</strong> posse e contraria princípios basilares do <strong>Direito</strong>

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!