Manual de Direito Civil - Flávio Tartuce - 7ª Ed. - 2017 [materialcursoseconcursos.blogspot.com.br]

Manual de Direito Civil<br />
CDC, notadamente porque não comprovada a existência de culpa exclusiva do recorrido,<br />
permanecendo hígida a responsabilidade objetiva da sociedade empresária fornecedora, ora<br />
recorrente. Por outro lado, consignou­se que a indenização de R$ 15 mil fixada pelo tribunal a<br />
quo não se mostra exorbitante. Considerou­se a sensação de náusea, asco e repugnância que<br />
acomete aquele que descobre ter ingerido alimento contaminado por um inseto morto,<br />
sobretudo uma barata, artrópode notadamente sujo, que vive nos esgotos e traz consigo o risco<br />
de inúmeras doenças. Note­se que, de acordo com a sentença, o recorrente já havia consumido<br />
parte do leite condensado, quando, por uma das pequenas aberturas feitas para sorver o<br />
produto chupando da própria lata, observou algo estranho saindo de uma delas, ou seja, houve<br />
contato direto com o inseto, o que aumenta a sensação de mal­estar. Além disso, não há dúvida<br />
de que essa sensação se protrai no tempo, causando incômodo durante longo período, vindo à<br />
tona sempre que se alimenta, em especial do produto que originou o problema, interferindo<br />
profundamente no cotidiano da pessoa” (STJ, REsp 1.239.060/MG, Rel. Min. Nancy<br />
Andrighi, j. 10.05.2011).<br />
Em sentido próximo ao último julgamento, deduziu a mesma Corte Superior que o dano moral está<br />
presente quando é encontrado um preservativo dentro de uma lata de extrato de tomate. O valor fixado a<br />
título de indenização foi de R$10.000,00 (dez mil reais), ressaltando­se a função educadora da reparação<br />
imaterial (STJ, REsp 1.317.611/RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 12.06.2012, publicado no<br />
Informativo n. 499).<br />
Em 2014, surgiu outra tendência no Tribunal da Cidadania, que passou a considerar a reparação de<br />
danos imateriais mesmo nos casos em que o produto não é consumido. Inaugurou­se, assim, uma forma<br />
de julgar que admite a reparação civil pelo perigo de dano, não mais tratada a hipótese como de mero<br />
aborrecimento ou transtorno cotidiano. Vejamos o teor da ementa, que foi publicada no Informativo n.<br />
537 daquela Corte Superior:<br />
“Recurso especial. Direito do consumidor. Ação de compensação por dano moral. Aquisição<br />
de garrafa de refrigerante contendo corpo estranho em seu conteúdo. Não ingestão. Exposição<br />
do consumidor a risco concreto de lesão à sua saúde e segurança. Fato do produto. Existência<br />
de dano moral. Violação do dever de não acarretar riscos ao consumidor. Ofensa ao direito<br />
fundamental à alimentação adequada. Artigos analisados: 4.º, 8.º, 12 e 18, CDC, e 2.º, Lei<br />
11.346/2006. 1. Ação de compensação por dano moral, ajuizada em 20.04.2007, da qual foi<br />
extraído o presente recurso especial, concluso ao gabinete em 10.06.2013. 2. Discute­se a<br />
existência de dano moral na hipótese em que o consumidor adquire garrafa de refrigerante com<br />
corpo estranho em seu conteúdo, sem, contudo, ingeri­lo. 3. A aquisição de produto de gênero<br />
alimentício contendo em seu interior corpo estranho, expondo o consumidor a risco concreto<br />
de lesão à sua saúde e segurança, ainda que não ocorra a ingestão de seu conteúdo, dá direito à<br />
compensação por dano moral, dada a ofensa ao direito fundamental à alimentação adequada,<br />
corolário do princípio da dignidade da pessoa humana. 4. Hipótese em que se caracteriza<br />
defeito do produto (art. 12, CDC), o qual expõe o consumidor a risco concreto de dano à sua<br />
saúde e segurança, em clara infringência ao dever legal dirigido ao fornecedor, previsto no art.<br />
8.º do CDC. 5. Recurso especial não provido” (STJ, REsp 1.424.304/SP, 3.ª Turma, Rel.<br />
Min. Nancy Andrighi, j. 11.03.2014, DJe 19.05.2014).<br />
Para o presente autor, trata­se de um caminhar para o reconhecimento da responsabilidade sem<br />
dano. Na doutrina contemporânea, como antes destacado, o tema é tratado por Pablo Malheiros da<br />
Cunha Frota, em sua tese de doutorado defendida na UFPR. 35 Destaca o professor que os juristas<br />
presentes no encontro de 2013 dos Grupos de Pesquisa em Direito Civil Constitucional, liderados pelos<br />
Professores Gustavo Tepedino (UERJ), Luiz Edson Fachin (UFPR) e Paulo Lôbo (UFPE), editaram a