19.04.2013 Views

A Noite Maldita - Crônicas do Fim do Mundo - Multi Download

A Noite Maldita - Crônicas do Fim do Mundo - Multi Download

A Noite Maldita - Crônicas do Fim do Mundo - Multi Download

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

CAPÍTULO 5<br />

Às dez para a meia-noite a sirene disparou no quartel <strong>do</strong> Corpo de Bombeiros. O<br />

tenente Douglas Obe, que acompanhava pela TV as reportagens na frente <strong>do</strong> fórum<br />

criminal da Barra Funda, saltou da cadeira, corren<strong>do</strong> para o armário e apanhan<strong>do</strong> seu<br />

equipamento. Perderia o anúncio <strong>do</strong> veredito <strong>do</strong> caso da promotora Raquel contra o<br />

traficante Djalma e teria que se contentar em assisti-lo em algum repeteco <strong>do</strong>s resumos<br />

da madrugada. O plantão tinha começa<strong>do</strong> calmo demais, era esse o prenúncio da<br />

tormenta. Assim que alcançou o caminhão-tanque, já ouvin<strong>do</strong> o motorista responden<strong>do</strong><br />

ao Copom e acionan<strong>do</strong> o motor, viu que Boris já estava sentan<strong>do</strong> em seu posto,<br />

apertan<strong>do</strong> as amarras da bota. Ele sempre fazia isso quan<strong>do</strong> estavam sain<strong>do</strong>. Mais vinte<br />

preciosos segun<strong>do</strong>s até os sete homens estarem dentro <strong>do</strong> veículo em seus postos e a<br />

resposta <strong>do</strong> Copom chegar. Era um galpão de embalagens arden<strong>do</strong> em chamas na Martin<br />

Burchard, uma das travessas da Rangel Pestana, coisa de dez quadras <strong>do</strong> quartel.<br />

— Abre o olho, Japa. Abre o olho. Não vai dar mole que nem da última vez em que<br />

pegou fogo na Rangel.<br />

Douglas Obe riu <strong>do</strong> comentário de Boris. Ele fazia questão de sempre lembrar <strong>do</strong><br />

episódio da Rangel Pestana, aconteci<strong>do</strong> um ano antes, em que Douglas teve que ser<br />

resgata<strong>do</strong>, em vez de resgatar. Douglas já tinha dezoito anos na corporação, era macaco<br />

velho, mas tinha cometi<strong>do</strong> um erro de iniciante ao atenderem uma ocorrência de<br />

incêndio num prédio que, na teoria, deveria estar desabita<strong>do</strong> e lacra<strong>do</strong> pela prefeitura.<br />

Contu<strong>do</strong>, ao serem chamadas, pessoas que tinham consegui<strong>do</strong> fugir <strong>do</strong> prédio em chamas<br />

por conta própria diziam que nos andares superiores viviam imigrantes ilegais usa<strong>do</strong>s na<br />

indústria clandestina da moda que abastecia centenas de lojas <strong>do</strong> centro de São Paulo.<br />

Douglas não tinha testa<strong>do</strong> seu rádio antes de deixar a unidade e, enquanto lutavam com a<br />

mangueira para controlar as chamas no segun<strong>do</strong> piso, ouviu um grito de socorro vin<strong>do</strong><br />

de cima. Subiu três andares desacompanha<strong>do</strong>, e então encontrou um apartamento com<br />

dezoito bolivianos. Uma mulher nanica, de cabelos negros, lisos e bastos, que batiam em<br />

suas nádegas, chorava, tossia e apontava para um senhor i<strong>do</strong>so. A fumaça era intensa no<br />

andar e eles sofriam com a supressão de oxigênio. Foi quan<strong>do</strong> Douglas acionou o rádio<br />

para pedir apoio que percebeu a besteira feita. Estava sem contato com o posto de<br />

coman<strong>do</strong>. Estava sozinho, ou melhor, rodea<strong>do</strong> por dezoito civis, sem retaguarda<br />

nenhuma para socorrê-los e sem conseguir entender uma palavra <strong>do</strong> que diziam num<br />

espanhol acelera<strong>do</strong> e embarga<strong>do</strong> pelo desespero. O velho estava com parada

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!