19.04.2013 Views

A Noite Maldita - Crônicas do Fim do Mundo - Multi Download

A Noite Maldita - Crônicas do Fim do Mundo - Multi Download

A Noite Maldita - Crônicas do Fim do Mundo - Multi Download

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

seu filho nos braços no meio de duas a<strong>do</strong>rmecidas. Contu<strong>do</strong>, arrefecen<strong>do</strong> seu desespero,<br />

ele voltou trazen<strong>do</strong> duas galinhas vivas, amarradas pelas pernas.<br />

— Toma. Faça uma para comermos hoje e almoçarmos amanhã. A outra eu deixo<br />

amarrada lá fora e a gente come na janta de amanhã. Depois vejo como fazer para<br />

comprar mais comida.<br />

Dolores ficara calada, olhan<strong>do</strong> para o galináceo por um momento, imaginan<strong>do</strong> como<br />

é que transformaria aquilo em alimento comestível.<br />

— Deu um trabalho dana<strong>do</strong> para achar essas galinhas. Foi numa granja lá embaixo,<br />

perto <strong>do</strong> rio.<br />

— Seu Tavares. Meu pai compra ovos na granja dele.<br />

— Está tu<strong>do</strong> fecha<strong>do</strong> e ninguém aceita dinheiro. A mulher da granja aceitou, graças a<br />

Deus. E vendeu pelo preço da tabela dela. Admirável.<br />

— Você tem que comprar um casal. Galo e galinhas.<br />

— Hã?<br />

— Se ficarmos aqui. Vamos precisar de galo e galinhas, delas botan<strong>do</strong> ovos.<br />

— Até que você não é burra, Dolores.<br />

— Não elogia ainda, não.<br />

— Por quê?<br />

— Porque eu não vou matar essa galinha pra cozinhar. Deus me livre!<br />

Começaram ali uma pequena discussão, Everal<strong>do</strong> dizen<strong>do</strong> que tinha anda<strong>do</strong> mais de<br />

cinco quilômetros para achar alguma coisa, que estava faminto e sem comer desde a<br />

noite anterior. Porém não teve argumento que convencesse a mulher a botar a mão na<br />

galinha e a matá-la. Everal<strong>do</strong> acabou amarran<strong>do</strong> uma delas embaixo de uma árvore e,<br />

fechan<strong>do</strong> os olhos e estremecen<strong>do</strong> ao ouvir o estalo, torci<strong>do</strong> o pescoço da outra. Soltou o<br />

corpo que estrebuchava entre seus de<strong>do</strong>s para logo se arrepender. A galinha, com o<br />

pescoço pendura<strong>do</strong> de la<strong>do</strong>, saiu corren<strong>do</strong> pelo terreiro em frente à casa, rodan<strong>do</strong> em<br />

círculos, fazen<strong>do</strong> o casal temer sua escapada. Logo Everal<strong>do</strong> cercou a penosa e, com uma<br />

faca limpa, terminou de partir o pescoço da criatura, fazen<strong>do</strong> o sangue dela verter sobre<br />

a terra.<br />

Dolores, ainda estenden<strong>do</strong> as fraldas, fazia careta ao se lembrar da lida com a galinha<br />

morta. Tirar as penas tinha da<strong>do</strong> um trabalho imenso, e o resulta<strong>do</strong>, patético, uma vez<br />

que, já na panela, ela ainda conservava algumas das penas e <strong>do</strong>s tubos que pareciam de<br />

plástico que cravavam em sua pele grossa. Dolores se virou com os temperos que a mãe<br />

mantinha na chácara e logo, apesar de bastante feia, a galinha ensopada estava cheiran<strong>do</strong><br />

gostoso. Um pouco de arroz para acompanhar com uma salada de agrião apanha<strong>do</strong> na<br />

roça <strong>do</strong> pai. Assim foi a primeira refeição decente da dupla em Santa Helena.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!