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A Noite Maldita - Crônicas do Fim do Mundo - Multi Download

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— Quan<strong>do</strong> eu cheguei em casa meu vô e minha vó estavam daquele jeito, <strong>do</strong>rmin<strong>do</strong>.<br />

Achei que eles tinham morri<strong>do</strong>, pô. Fiquei mó mal pensan<strong>do</strong> nisso. Aí começou a gritaria<br />

no apartamento <strong>do</strong> la<strong>do</strong> e vi mais gente falan<strong>do</strong> disso. Fui até o quarto <strong>do</strong> meu irmão e<br />

ele estava <strong>do</strong>rmin<strong>do</strong> também, mas acor<strong>do</strong>u, graças a Deus. Ontem a gente veio aqui para<br />

o Hospital das Clínicas ver se tinha cura para isso que os meus avós têm.<br />

— E os seus pais? — perguntou Graziano.<br />

— Eu não tenho pai. Minha mãe vive sozinha em Barra Mansa.<br />

— Ali já é Rio de Janeiro, né?<br />

— É, sim, senhor.<br />

— Não precisa me chamar de senhor, não, cara. Estamos to<strong>do</strong>s no mesmo barco —<br />

respondeu Graziano.<br />

— É costume. Meus avós me ensinaram assim.<br />

Rui baixou a cabeça, com os olhos mareja<strong>do</strong>s.<br />

— Será que eles vão acordar de novo?<br />

O pessoal na Land Rover ficou cala<strong>do</strong> um segun<strong>do</strong>.<br />

— Dizem que tem gente acordan<strong>do</strong>. Eu não vi ninguém que acor<strong>do</strong>u, mas lá no<br />

hospital tão dizen<strong>do</strong> isso — continuou Rui. — E tem esses que se transformaram. Isso<br />

parece coisa <strong>do</strong> diabo. Acho que é o fim <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> mesmo.<br />

— Eu achei que a gente não passava dessa noite, policiais. Um amigo seu se quebrou<br />

todinho lá no HC, mas segurou a onda e salvou a gente.<br />

— Ele tá falan<strong>do</strong> <strong>do</strong> Benício. Está com o braço quebra<strong>do</strong> — explicou Cássio para<br />

Graziano.<br />

— Ele disse que foi quan<strong>do</strong> caiu <strong>do</strong> cavalo, quan<strong>do</strong> aquelas coisas vieram de uma vez,<br />

que nem uma onda — disse o enfermeiro Alexandre. — Ajudei a cuidar da fratura dele.<br />

Teve sorte, a <strong>do</strong>utora conseguiu fazer uma redução e colocar no lugar sem cirurgia.<br />

— Nunca vi tanta gente morta — juntou Rui.<br />

— E olhem para essas ruas. Parece guerrilha.<br />

Cássio olhou para Graziano, concordan<strong>do</strong> com o amigo.<br />

Quan<strong>do</strong> chegaram ao Regimento de Cavalaria os policiais foram os primeiros a<br />

descer. Janelas e paredes negras ainda soltavam um pouco de fumaça, revelan<strong>do</strong> aos<br />

visitantes um pouco <strong>do</strong> que tinha aconteci<strong>do</strong> ali durante a noite. Cássio chegou a sentir<br />

um frio no coração. Conhecia cada palmo daquele quartel, e ver o ambiente de seu<br />

trabalho nos últimos oito anos devasta<strong>do</strong> provocava um efeito similar em sua memória,<br />

era como ter parte de sua própria existência aniquilada. Era como se o mun<strong>do</strong> estivesse<br />

se dividin<strong>do</strong> entre o antes daquela noite maldita e o depois, a nova realidade. Cássio<br />

ergueu os olhos em direção às cocheiras e viu uma militar acenan<strong>do</strong>. Era uma senhora

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