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A Noite Maldita - Crônicas do Fim do Mundo - Multi Download

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CAPÍTULO 48<br />

Suzana olhou para o relógio de parede em sua sala. Com exceção da luz <strong>do</strong> teto<br />

apagada, estava tu<strong>do</strong> ordinariamente dentro <strong>do</strong> comum, como se estivesse em um dia de<br />

trabalho banal. Engoliu os segun<strong>do</strong>s seguintes com um sabor amargo durante a<br />

contemplação daquele espaço. Era uma despedida. Sabia que tardaria — se é que voltaria<br />

— a ocupar aquela sala, de diretora <strong>do</strong> Hospital das Clínicas. O peso em seus ombros só<br />

fazia aumentar com o passar das horas, e agora os ponteiros indicavam duas e vinte da<br />

tarde. Doutor Elias, ainda que contraria<strong>do</strong> com a decisão de fugirem de São Paulo, tinha<br />

se torna<strong>do</strong> um tipo de recensea<strong>do</strong>r oficial <strong>do</strong> plano de emergência, escalan<strong>do</strong> mais quatro<br />

enfermeiros e um parente de paciente para lhe dar apoio e, três horas depois da escolha,<br />

chegava com os primeiros números “oficiais” da debandada <strong>do</strong> HC. Sorte que decisões<br />

prévias tinham leva<strong>do</strong> a um esvaziamento <strong>do</strong>s leitos, e muitos pacientes e parentes<br />

tinham i<strong>do</strong> embora quan<strong>do</strong> a desordem toda começou noites atrás com o surgimento <strong>do</strong>s<br />

primeiros a<strong>do</strong>rmeci<strong>do</strong>s. Eram 430 pacientes de to<strong>do</strong>s os hospitais <strong>do</strong> complexo das<br />

Clínicas, 115 acompanhantes desses pacientes, 380 a<strong>do</strong>rmeci<strong>do</strong>s, soman<strong>do</strong> aí mais 290<br />

parentes que tinham trazi<strong>do</strong> essa gente apagada e ali aguarda<strong>do</strong>, 183 profissionais das<br />

Clínicas, como médicos e residentes, enfermeiros, auxiliares de enfermagem, toda a sorte<br />

de pessoal administrativo, seguranças, instrumenta<strong>do</strong>res e técnicos de várias áreas de<br />

medicina de diagnóstico. Elias tinha os números esmiuça<strong>do</strong>s <strong>do</strong> pessoal, deixan<strong>do</strong> saber,<br />

por exemplo, que seguiriam com o comboio 36 médicos e residentes, 49 enfermeiros, 9<br />

seguranças e 27 auxiliares de enfermagem. Cada classe trabalha<strong>do</strong>ra presente estava lá,<br />

listada e quantificada. Outro número assombroso era o de a<strong>do</strong>rmeci<strong>do</strong>s que tinham si<strong>do</strong><br />

aban<strong>do</strong>na<strong>do</strong>s nos corre<strong>do</strong>res <strong>do</strong> prédio de ambulatórios. Nada mais, nada menos que 176<br />

pessoas. Todas essas cabeças somadas faziam o total de 1589 indivíduos, sem contar o<br />

sargento Cássio e seu companheiro. Os carros disponíveis montavam uma frota de 72<br />

veículos de passeio <strong>do</strong>s mais varia<strong>do</strong>s tipos e modelos. Elias, toman<strong>do</strong> o cuida<strong>do</strong> de<br />

perguntar a lotação de cada veículo e, sem espremer ninguém, levan<strong>do</strong> em conta as leis<br />

de trânsito, concluiu que dispunham então de 386 lugares, deixan<strong>do</strong> um preocupante<br />

déficit de 1203 pessoas. Suzana estava com a boca seca. Fosse qual fosse o plano <strong>do</strong><br />

sargento, seria desejável que contivesse duas dúzias de ônibus, ou algo que os equivalesse<br />

para dar conta de tanta gente. Ela podia dizer, com toda a convicção, que poucas vezes<br />

na vida havia ti<strong>do</strong> me<strong>do</strong>. Era o me<strong>do</strong> que gotejava em sua língua e descia pela garganta<br />

envenenan<strong>do</strong> seu corpo, fazen<strong>do</strong> seu estômago embrulhar. Respirou fun<strong>do</strong> e fechou a

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