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A Noite Maldita - Crônicas do Fim do Mundo - Multi Download

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imóvel. Estivera assim desde a tarde, desde que toda a confusão tinha começa<strong>do</strong> ali<br />

dentro <strong>do</strong> CDP. Funcionários ausentes, rádios enguiça<strong>do</strong>s e telefones quebra<strong>do</strong>s tinham<br />

coloca<strong>do</strong> to<strong>do</strong> mun<strong>do</strong> em alerta, e o falatório começara nas celas. Muitos prisioneiros<br />

não tinham desperta<strong>do</strong> na alvorada, até mesmo <strong>do</strong>is agentes <strong>do</strong> plantão tinham saí<strong>do</strong> de<br />

ambulância. O carcereiro ouviu dizer que o diretor man<strong>do</strong>u buscar um médico no<br />

Instituto Médico Legal, nas Clínicas, para examinar os detentos e dizer o que se passava.<br />

Agora essa, mais um prisioneiro que não despertava.<br />

— Tá acorda<strong>do</strong>, cidadão? Você tem visita.<br />

Nenhuma resposta.<br />

— Vai, vagabun<strong>do</strong>! Acorda!<br />

O carcereiro voltou a pensar no surto de gente que havia <strong>do</strong>rmi<strong>do</strong> e não mais<br />

acordara. Não se falava em outra coisa ali dentro da cadeia, até mesmo porque quem<br />

vinha de fora dava notícias de como as coisas estavam perturba<strong>do</strong>ras nas ruas da cidade.<br />

Mesmo desconfian<strong>do</strong> que o detento tinha si<strong>do</strong> apanha<strong>do</strong> por aquele sono enigmático,<br />

não se atreveu a colocar a chave na fechadura. Iria falar com o tal agente Federal que não<br />

saíra dali nem um minuto desde que o visitante célebre passara a ocupar a cela nove.<br />

Quan<strong>do</strong> se virou para voltar ao corre<strong>do</strong>r, um sobressalto colossal o fez tremer. Tinha<br />

uma mulher parada bem à sua frente, e não era uma mulher qualquer. Era a promotora.<br />

O que ela estava fazen<strong>do</strong> ali? Era uma peça incomum para aquele cenário da madrugada,<br />

e tinha mais coisas fora <strong>do</strong> padrão em sua espectral presença. O carcereiro juntou as<br />

sobrancelhas, tentan<strong>do</strong> entender. Aquilo manchan<strong>do</strong> o queixo da promotora Raquel...<br />

Seria sangue? Antes que atinasse com uma resposta, antes que formulasse outro<br />

pensamento, seu corpo foi arremessa<strong>do</strong> contra a porta metálica da cela de Djalma. Podia<br />

jurar ter ouvi<strong>do</strong> um som de metal entortan<strong>do</strong> com uma explosão de <strong>do</strong>r insuportável,<br />

resultan<strong>do</strong> num grito pavoroso. Sua clavícula havia se parti<strong>do</strong> com o empurrão da<br />

mulher, e agora não pensava mais em como ela tinha i<strong>do</strong> parar ali, muito menos no que<br />

era aquilo que lambuzava a boca da promotora. Só pensava em viver, em tentar retomar<br />

o ar que ela impedia que chegasse aos seus pulmões, em vencer aquelas mãos frias e<br />

aquele braço forte que tinha lhe tira<strong>do</strong> <strong>do</strong> chão como se fosse um saco de penas. Queria<br />

se livrar da <strong>do</strong>r. A <strong>do</strong>r <strong>do</strong>s ossos quebra<strong>do</strong>s em seu ombro era passa<strong>do</strong>, e agora sentia<br />

agulhas penetrarem sua carne, seu pescoço. A língua da promotora ruiva era áspera como<br />

a de um gato e raspava em sua pele. A mordida foi mais poderosa <strong>do</strong> que tu<strong>do</strong> que ele<br />

pôde pensar, e então veio o breu e o silêncio, um casal cuida<strong>do</strong>so carregan<strong>do</strong>-o pela mão,<br />

levan<strong>do</strong>-o dali, fazen<strong>do</strong>-o existir em outro lugar.<br />

Raquel soltou o corpo pesa<strong>do</strong> <strong>do</strong> homem sobre o chão frio. O carcereiro<br />

desmoronou como um far<strong>do</strong> de arroz, sem vida, sem graça. Magalhães tinha da<strong>do</strong> mais

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