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A Noite Maldita - Crônicas do Fim do Mundo - Multi Download

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— Pisar no pé e empurrar.<br />

— Isso. Ele rolou no corre<strong>do</strong>r, levantou gritan<strong>do</strong>, mas aí eu já estava aqui dentro <strong>do</strong><br />

quarto e tranquei a porta. Ele ficou empurran<strong>do</strong> <strong>do</strong> la<strong>do</strong> de fora até quase o sol raiar.<br />

Amintas foi até o quarto da mãe. A manta que a velha usava para se cobrir durante a<br />

noite estava no chão, e uma sapateira junto à janela, tombada. O leão de chácara olhou<br />

debaixo da cama de <strong>do</strong>na Zefa só para garantir. O quarto estava vazio. Voltou até a sala<br />

e ligou a TV. Chuvisco.<br />

— Estamos sem saber o que está acontecen<strong>do</strong> no mun<strong>do</strong>. Sem televisão, sem telefone,<br />

sem rádio.<br />

— O que está acontecen<strong>do</strong>, amor?<br />

— Eu consegui o empréstimo — disse Amintas.<br />

A esposa chegou mais perto, enquanto a velha também surgia ao fim <strong>do</strong> corre<strong>do</strong>r.<br />

— O empréstimo da casa própria.<br />

Graça continuou esfregan<strong>do</strong> os braços e se aproximou <strong>do</strong> mari<strong>do</strong>, que olhava pela<br />

janela da sala <strong>do</strong> apartamento. Ao longe viu a larga e assusta<strong>do</strong>ra coluna de fumaça negra<br />

elevan<strong>do</strong>-se ao céu, vin<strong>do</strong> da direção <strong>do</strong> centro de Belém. Olhou para a rua e viu pessoas<br />

caminhan<strong>do</strong>, assustadas, algumas levan<strong>do</strong> trouxas em cima das cabeças, homens<br />

carregan<strong>do</strong> pertences em carrinhos de mão e muita gente desacordada sen<strong>do</strong> carregada<br />

por to<strong>do</strong>s os la<strong>do</strong>s. Os desmaia<strong>do</strong>s eram crianças, jovens, adultos e velhos, homens e<br />

mulheres, como se uma grande praga tivesse se abati<strong>do</strong> sobre a humanidade.<br />

— O que está acontecen<strong>do</strong>, Amintas?<br />

— Não sei, meu bem. Não sei.<br />

— Eu falei que era coisa <strong>do</strong> cão — resmungou <strong>do</strong>na Zefa, olhan<strong>do</strong> para a fumaça no<br />

horizonte. — Primeiro o mun<strong>do</strong> acabou em água, agora vai acabar em fogo e fumaça.<br />

— Misericórdia, <strong>do</strong>na Zefa! Não fale um negócio desses!<br />

Amintas, ven<strong>do</strong> as pessoas deixan<strong>do</strong> suas casas com seus <strong>do</strong>entes, notou que to<strong>do</strong>s se<br />

dirigiam ao centro da cidade para buscar ajuda.<br />

— Ninguém vai ajudá-los no centro da cidade. Ninguém.<br />

— Eu vou chegar atrasada no trabalho hoje, e <strong>do</strong>na Eunice vai me comer o fíga<strong>do</strong>.<br />

— Tu não vais trabalhar hoje, Gracinha. Não é seguro.<br />

— Mas, Amintas! Tu conseguiste o empréstimo. Agora, mais <strong>do</strong> que nunca, vamos<br />

precisar de nossos empregos. Se eu falto, a <strong>do</strong>na Eunice me manda embora.<br />

— Eu cui<strong>do</strong> daquela vaca da tua patroa quan<strong>do</strong> as coisas voltarem ao normal —<br />

respondeu em voz baixa.<br />

— Eu conheço essa tua voz, seu Amintas. Quan<strong>do</strong> começa a falar desse jeito é porque<br />

está maquinan<strong>do</strong> alguma coisa.

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