19.04.2013 Views

A Noite Maldita - Crônicas do Fim do Mundo - Multi Download

A Noite Maldita - Crônicas do Fim do Mundo - Multi Download

A Noite Maldita - Crônicas do Fim do Mundo - Multi Download

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

afastou de lá umas duas vezes porque Boris tinha insisti<strong>do</strong> muito e se prontifica<strong>do</strong> a ficar<br />

ali, <strong>do</strong> ladinho da afilhada. Douglas sorriu das lembranças, cinco anos depois aquilo era<br />

passa<strong>do</strong> e estavam ali, firmes e fortes. O que os colegas mais comentavam a respeito <strong>do</strong><br />

tenente Boris é que ele mudava da “água para o fogo” quan<strong>do</strong> o alarme soava no quartel,<br />

momento em que sua personalidade retraída e reservada evaporava, e o vapor fazia<br />

existir um novo Boris, comunicativo, alerta e imponente. Boris era sempre o primeiro a<br />

embarcar na viatura. Era sempre o primeiro a tirar alguém <strong>do</strong> prédio ou da casa em<br />

chamas; ele era a personificação daquela imagem mítica e glamourosa que a população<br />

tinha de um bombeiro: um herói. Por outro la<strong>do</strong>, nada tinha de arrogante ou bravateiro:<br />

assim que as chamas eram debeladas, o rescal<strong>do</strong> finaliza<strong>do</strong> e as mangueiras enroladas,<br />

Boris era o primeiro a desaparecer da cena e recolher-se ao quartel. Nada de entrevistas,<br />

nada de televisão. A impressão que se tinha era de que aquele segun<strong>do</strong> Boris, das<br />

labaredas, das escadas <strong>do</strong> veículo plataforma, era uma máscara <strong>do</strong> seu teatro pessoal e<br />

que, quan<strong>do</strong> as chamas <strong>do</strong> palco se apagavam, Boris voltava a ser só o primeiro Boris, o<br />

cala<strong>do</strong>, o discreto, a sombra.<br />

O caminhão fez uma curva rápida sobre o Viaduto Vinte e Cinco de Março,<br />

desvian<strong>do</strong> de um ônibus, balançan<strong>do</strong> os bombeiros e obrigan<strong>do</strong>-os a se apoiarem com<br />

força. A buzina grave e prolongada era disparada vez ou outra, encobrin<strong>do</strong> o som das<br />

sirenes, buscan<strong>do</strong> afastar os taxistas distraí<strong>do</strong>s e os bêba<strong>do</strong>s que resolviam parar no meio<br />

da rua. Som de sirene havia muito já tinha se mimetiza<strong>do</strong> ao som ambiente da capital,<br />

fican<strong>do</strong> nivela<strong>do</strong> ao ruí<strong>do</strong> branco, permanente, mas, quan<strong>do</strong> a buzina <strong>do</strong> caminhãotanque<br />

era disparada, qualquer ser vivo virava a cabeça para olhar, e ninguém brincava<br />

na frente de uma viatura vermelho-vivo <strong>do</strong> corpo de bombeiros. Em um minuto a<br />

distância <strong>do</strong> quartel até a Rangel Pestana <strong>do</strong> outro la<strong>do</strong> <strong>do</strong> viaduto foi devorada; as luzes<br />

<strong>do</strong> quarteirão tinham caí<strong>do</strong>, e um clarão agourento alaranjava a paisagem. Os solda<strong>do</strong>s<br />

dentro da unidade ficaram cala<strong>do</strong>s. Colunas monstruosas de fumaça subiam para o céu.<br />

Duas unidades de resgate estavam estacionadas logo à frente, viaturas da guarda<br />

metropolitana fechavam as ruas, crian<strong>do</strong> um cordão de isolamento. O motorista desligou<br />

as sirenes e deu duas buzinadas, chaman<strong>do</strong> a atenção <strong>do</strong>s homens à frente e chaman<strong>do</strong> o<br />

Copom no rádio. Os bombeiros saltaram <strong>do</strong> caminhão-tanque encaran<strong>do</strong> as labaredas<br />

que subiam além <strong>do</strong> telha<strong>do</strong>. O calor emanava pelo ar e ao re<strong>do</strong>r <strong>do</strong> quarteirão, dan<strong>do</strong><br />

uma boa ideia <strong>do</strong> inferno que os aguardava lá dentro. Boris correu para os coman<strong>do</strong>s <strong>do</strong><br />

tanque, ativan<strong>do</strong> a bomba-d’água <strong>do</strong> veículo. Primeiro tinha que diminuir a temperatura<br />

na frente <strong>do</strong> galpão e criar um campo de trabalho para os companheiros começarem a<br />

debelar as chamas.<br />

— Douglas, rápi<strong>do</strong> com a avaliação! Quero mandar água no telha<strong>do</strong>!

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!