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A Noite Maldita - Crônicas do Fim do Mundo - Multi Download

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CAPÍTULO 6<br />

Lúcio suava em bicas enquanto jogava mais uma pá de terra para cima. Tinha feito<br />

uma cova com três palmos e sentia os músculos <strong>do</strong> braço arderem como fogo. Sentia um<br />

embrulho no estômago. Era um criminoso recém-saí<strong>do</strong> da cadeia, pego por um assalto<br />

malsucedi<strong>do</strong>. Passara três anos na prisão, onde foi alicia<strong>do</strong> pelo ban<strong>do</strong> <strong>do</strong> Comandante à<br />

guisa de proteção. Lúcio era um sujeito mirra<strong>do</strong> e assustadiço, que vivia pelos cantos. Era<br />

<strong>do</strong> tipo a quem se dava ordens e não se fazia pedi<strong>do</strong>s. Esse comportamento inerme e<br />

adula<strong>do</strong>r cheirava longe. Por conta disso, ao chegarem ao pé <strong>do</strong> barranco onde<br />

enterrariam os corpos, a pá voou para sua mão como se fosse teleguiada. Apesar de<br />

bandi<strong>do</strong> e engaja<strong>do</strong> no tráfico, ainda não estava habitua<strong>do</strong> a assassinatos, e matar uma<br />

promotora ainda soava-lhe como estupidez pura. Ainda mais “a promotora”. Será que<br />

aqueles energúmenos não entendiam que com o Djalmão encarcera<strong>do</strong> a casa toda ia cair e<br />

que matar a ruiva só ia trazer os meganhas ainda mais rápi<strong>do</strong> para perto deles? Nem<br />

perdeu tempo abrin<strong>do</strong> a boca, como fizera no cativeiro; sabia muito bem qual era o seu<br />

lugar naquela operação, não era ele quem tomava as decisões. Ademais, Lúcio conhecia<br />

sua covardia muito bem. Tinha plena ciência de que estava longe de ter estômago para<br />

tomar as tais decisões na hora em que fossem necessárias. Cavar uma cova era ok. Além<br />

das mortas soltas no barro, havia algo que lhe incomodava. Aquele história toda de os<br />

celulares não funcionarem. Não conseguiam falar com mais ninguém <strong>do</strong> ban<strong>do</strong> e não<br />

haviam ti<strong>do</strong> uma única palavra <strong>do</strong> Comandante. Lúcio estava desconfortável com isso<br />

porque era o mais novo, e as coisas sempre fediam para o la<strong>do</strong> <strong>do</strong> novato. O cheiro<br />

daquilo era da mais fresca e perfeita merda. Celulares sem sinal já podia ser coisa <strong>do</strong>s<br />

meganhas. Secou o suor da testa, jogou a franja para o la<strong>do</strong> e olhou por um segun<strong>do</strong> para<br />

o barranco. O Cabeção e o Adilson eram chega<strong>do</strong>s de longa data e fumavam ali, ao seu<br />

la<strong>do</strong>, na beira da cova, sem ao menos oferecer um cigarro. Estavam ouriça<strong>do</strong>s, olhan<strong>do</strong><br />

para os la<strong>do</strong>s. Certamente iam falar que a culpa era toda dele se o Comandante ficasse<br />

ataca<strong>do</strong> com a notícia da morte da urubuzona.<br />

— Vamos, Lúcio! Agita essa terra aí! Tem que enterrar as duas, porra! — reclamou<br />

Adilson.<br />

Cabeção estava cala<strong>do</strong>, agacha<strong>do</strong> ao la<strong>do</strong> da Sardenta. Parecia fazer uma oração, ou<br />

coisa assim. De onde Lúcio estava, o líder parecia estar de olhos fecha<strong>do</strong>s e balbucian<strong>do</strong><br />

alguma coisa. Talvez fosse essa a única linha de comunicação que estivesse funcionan<strong>do</strong><br />

naquela noite, as preces. Até mesmo as preces <strong>do</strong>s bandi<strong>do</strong>s eram ouvidas vez ou outra.

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