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A Noite Maldita - Crônicas do Fim do Mundo - Multi Download

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— E minha irmã?<br />

— Está sob os cuida<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s enfermeiros, no ônibus conduzi<strong>do</strong> pela <strong>do</strong>na Diana.<br />

Cássio subiu no veículo, infestan<strong>do</strong> o ambiente com o seu o<strong>do</strong>r aze<strong>do</strong>.<br />

— Melhor feder aqui <strong>do</strong> que junto aos convalescentes. O senhor ia acabar matan<strong>do</strong><br />

um deles.<br />

— Deles? Tem mais gente convalescente além de minha irmã?<br />

— Não lhe contaram ainda, sargento? — perguntou Ikeda em tom de chacota. — O<br />

solda<strong>do</strong> Castro vai ser papai.<br />

Cássio franziu a testa e olhou para o solda<strong>do</strong> Castro que balançava a cabeça<br />

negativamente.<br />

— Ele encontrou um bebê perdi<strong>do</strong> dentro de uma das casas.<br />

— Qual casa?<br />

— A <strong>do</strong> pesca<strong>do</strong>r — antecipou Castro.<br />

— Ah! Não brinca! A casa <strong>do</strong> seu Adão?<br />

— Isso aí.<br />

— Poxa, eu conhecia o seu Adão. Muito gente boa ele e a <strong>do</strong>na Laila.<br />

— Ele tá vin<strong>do</strong> aí atrás. A<strong>do</strong>rmeci<strong>do</strong>.<br />

— Já a <strong>do</strong>na Laila, a mãe <strong>do</strong> bebê, tá mortinha da silva — revelou Castro.<br />

— Aí o Castro resolveu ser papai <strong>do</strong> neném — brincou Ikeda. — Cuidan<strong>do</strong> dele com<br />

a enfermeira gatinha, a Nádia.<br />

Castro arremessou um magazine de munição contra a cabeça de Ikeda, acertan<strong>do</strong> em<br />

seu capacete.<br />

— Nada bobo você, não é, Castro? A Nádia toda peitudinha e bundudinha, e você lá,<br />

pagan<strong>do</strong> de papito <strong>do</strong> Fernan<strong>do</strong>.<br />

Cássio ficou cala<strong>do</strong>, perdi<strong>do</strong> em seus pensamentos. Todas aquelas pessoas <strong>do</strong> dia a<br />

dia. Ainda que não convivesse com elas, que não se preocupasse to<strong>do</strong>s os dias, que não<br />

tivesse liga<strong>do</strong> para nenhuma delas na última semana, que não tivesse i<strong>do</strong> almoçar frango<br />

com polenta, to<strong>do</strong>s elas tinham si<strong>do</strong> apanhadas por aquele revés. Sua irmã estava num<br />

daqueles ônibus, tomada por um pânico infinito, sofren<strong>do</strong> a perda <strong>do</strong>s filhos. Ele tinha se<br />

arrasta<strong>do</strong> por horas e horas nos esgotos da cidade de São Paulo, procuran<strong>do</strong> os sobrinhos.<br />

Fernan<strong>do</strong> tinha fica<strong>do</strong> órfão de uma hora para a outra. Quantas histórias como aquela<br />

estavam sen<strong>do</strong> vividas naquele exato momento? Milhares? Milhões? As crônicas <strong>do</strong> fim<br />

<strong>do</strong> mun<strong>do</strong> seriam escritas um dia, dan<strong>do</strong> conta de tantos dissabores e alegrias que fossem<br />

possíveis de ser conta<strong>do</strong>s. O balé da morte também convidava à dança da vida, posto que<br />

a humanidade se agarrava em qualquer esperança de sobreviver... E sobreviveria.

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